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O ruído de fundo. Um ramerrão
desaustinado como se fosse tareia no juízo. Protestam, as suas vozes roucas,
hormonais, ecoando até à lonjura dos alicerces ósseos. Move-os a, dir-se-ia,
infinita paciência. Não têm sono, trespassando a noite até dela já sobrar a
claridade que apregoa a alvorada. Os loucos noturnos, desapossados do sono, não
contam as horas enquanto a noite foge para a dissolução. Só se apagam quando a
luz clara da manhã despoja a noite do seu império, quando as luzes dos
candeeiros se apagam em sua inutilidade efémera.
A insanidade é decretada pelos
enfastiados que protestam contra o sono arrombado pela algazarra. Vêm à janela
e vociferam, pedindo que os foliões desatem os nós da comiseração que nidifica
algures no sangue turvado pelo álcool. Os foliões, incomodados pela vozearia
que vem de andares superiores, espreitam com desdém entre a penumbra que os
olhos embaciados consentem. Uns depressa devolvem o olhar ao piso térreo onde,
debitam as bebidas que acompanham os acordes disformes de uma não melodia
embatucada. Outros zombam dos vizinhos que queriam o sossego que deixasse o
sono aterrar.
Na descompensação dos
interesses, subiram aos insultos que já voejavam de cima para baixo e vice
versa. A mulher gorda baixou os braços e subiu uma perna, os primeiros ao
encontro dos segundos, e descalçou o chinelo roto que, ato contínuo, ganhou
asas na direção da turba ruidosa. Uma rapariga que se enamorava de um diletante
sentiu o catingoso chinelo esbarrar no rosto que ficou empolado com o rubor da
fricção. Uma rapaz nas imediações ajuramentou vingança e, na hora, lançou o
copo ainda meio cheio com uma mistela qualquer, fazendo da velha gorda ponto de
mira. Não haveria de acertar, que o estado etilizado não caucionava equilíbrio
qualquer.
O consorte da velha ofendida
pediu gentilmente o chinelo perdido. Devolveram-lhe um paralelepípedo que
falhou o alvo por centímetros. O velho deixou-se de mesuras, saiu disparado
para a cozinha de onde trouxe uma bacia onde estava em dessalga um bacalhau
inteiro. A água fétida foi aguaceiro aspergido sobre a turba barulhenta. E nem
o cheiro imundo do bacalhau a demolhar há quatro dias usurpou a folgança. De cá
de baixo, um jovem nada entediado com uma lasca de bacalhau que viera junto com
a água da demolha, berrou: “da próxima vez,
atira whisky!”
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