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Os meses, e depois os anos,
foram a caução da generosidade dos ricos. Até dos irredutíveis. Fosse por
conversão espontânea ou por oportunismo (a dissidência levava a um beco sem
saída), os endinheirados destravaram a sonhada transfusão de riqueza para os erários
públicos. Os genuínos revolucionários, os mais radicais de todos eles,
duvidavam que fosse possível uma conversão espontânea e queriam julgar, em
justiça sumária e sem contraditório, os ricos mais ou menos arrependidos da
riqueza amealhada. Os moderados triunfaram: a grandeza mostrava-se na
complacência. Julgá-los depois de terem voluntariamente abdicado da riqueza
podia soar a mesquinha vingança.
A revolução que se instalara por
todos os lados atormentava-se com assuntos mais urgentes. Agora que os cofres
públicos estavam empanturrados, urgiam as necessidades sociais. Era preciso
corrigir as injustiças sedimentadas. Os revolucionários – os que deram o peito
às balas; e os idealistas, os que raramente saíam à rua, mas tiveram a
paternidade intelectual dos protestos – chamavam a razão a si. Ainda sem ser a
destempo. Ficava provado, por linhas tortas, que os ricos podiam alimentar a
justiça social. Eles não podiam fugir para lado nenhum quando por todo o lado a
maré do arrependimento capitalista depunha regimes coniventes e corrompidos.
Agora havia existências suficientes para praticar a justiça social.
O igualitarismo era apregoado em
uníssono. Pelos que sempre o apregoaram e pelos mais recentes convertidos, nem
que fosse por não espontânea adesão ao modismo. Ninguém ousava desalinhar,
temente de sucumbir sob o pesado manto da censura social com a cobertura do
pensamento unânime. As injustiças colhidas do passado começaram a ser
corrigidas. E a ser praticada discriminação positiva (entretanto medalhada com
o timbre de teoria oficial). No trabalho, não eram os mais aptos que recebiam
mais dinheiro. Quando se mantinham chefias, os superiores não recebiam as
remunerações mais vistosas. Os subsídios para os mais desprotegidos tinham
crescido números astronómicos. Os alimentos eram fartamente subsidiados. A
saúde toda gratuita. Não se pagava nada nas escolas e nas universidades
(entretanto reformatadas para corresponderem ao novo catecismo ideológico). Os
bancos já não eram entidades usurárias.
O ar era, enfim, respirável. Todos
os dias amanheciam abraçados a uma espessura radiosa. A equidade deixara de ser
um sonho.
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