27.12.12

Maré tingida


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Estremecimento. Um abalo telúrico a cindir-se com as nuvens que emprestavam escurecimento ao céu. As águas orquestradas pela maré espelhavam os mesmos sedimentos de outrora. Uma pergunta assomava entre a espuma das bravias águas do mar: as marés são uma antecâmara de amanhãs, como se fossem um presságio assinado com o fermento de um outrora?
O estremecimento ecoava as ondas de choque do terramoto interior. Podiam ser apenas os fusos horários do entendimento desfeito em equívoco, e o entendimento já embaciado. A condizer com o dia londrino, o nevoeiro perpetuando a escuridão pela manhã fora. Às tantas, as interrogações que se sobrepunham esmagavam-se contra a porta férrea onde estavam em sobressalto os pensamentos. Uma das interrogações, a mais preciosa, desafiava a intrepidez do abalo telúrico que desapossara o mar chão. Era a vez das ondas chegarem ao areal numa fúria avassaladora, fundindo-se nas rochas erodidas.
A descompostura dos pensamentos convocava serão em demanda de lucidez. E mesmo que soubesse que da errância noturna não esboçava a intuição cobiçada, meteu os pés às ruas. Precisava de alquebrar a febre que vinha do assalto das interrogações incessantes. Precisava de estugar o passo nas ruas movimentadas, encontrar um promontório onde o pensamento febril, sozinho, contemplasse as luzes que não adormeciam. A embocadura do mar, onde outra maré que parecia repetitiva molhava as rochas e o areal, seria o tribunal supremo. Podia ser que a maresia desatasse os nós que pareciam amarrados por marinheiro experiente. Podia ser que a noite branca resgatasse a claridade que andava a monte, turvada pelas nuvens pesadas que sobressaiam no céu colonizado pela noite escura.
Entre os néon nada clarividentes e a traficância noturna, as palavras embotadas na maré enfurecida dariam respostas. Seriam respostas sem acerto, um caldo de ilusões em que marejavam os olhos das tágides companheiras dos pensamentos amotinados. Mas nem isso interessava. Só a fechadura de onde seriam devolvidas respostas. Já incensadas pela penumbra em que se depunha a madrugada.

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