3.12.12

O curto-circuito


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Às estrelas, por entre as insónias demoradas, validava as inquietações. Mantinha o olhar no céu e não eram trevas o que aos olhos chegava. Entre as estrelas, mesmo por dentro da sua cintilação, procurava respostas. Tinha esgotado as possibilidades no lodaçal terreno. As pessoas no entorno tinham desistido das respostas. Quando as haviam dado, eram incompletas.
Consumia-se na sua rebeldia interior. A revolta levava um fermento latente, incendiada pelas nauseabundas injustiças legadas pelo mundo em redor. Os circuitos internos estavam ferventes. O sobressalto das dúvidas era um trono crepuscular, antes de o corpo se entregar à volúpia ocasional. Já não confidenciava nem com amigos de longa data. Não queria encarar o opróbrio que alguns, muito dados às coisas da moralidade, lhe atiravam para o dorso. O sobressalto era um contínuo. Era o frémito que não conseguia domar e que a levava aos atos que depois julgava tresloucados. Temia que a lucidez estivesse em extinção. Eram as dores do arrependimento, quando a educação casta se insinuava nos interstícios da memória. À medida que o curto-circuito deixara de ser improvável, refugiou a parte escondida de si num casulo que só ela conhecia. Tinha uma imagem esquizofrénica, como se levasse uma vida dupla, ou fosse um alter ego de si mesma.
Um dia, vinha da volúpia noturna, parou em frente ao cais deserto. Amparada pelas colunas encardidas, deixou-se arquear à medida que as mãos massajavam os cabelos engordurados. Eram tantas as vezes que perguntava o que andava a fazer com a vida, tanta a exasperação com os acessos de lucidez. Esbracejava, berrava interiormente contra os oráculos da decência que se mantinham acesos à frente dos olhos. Queira ser invadida pela loucura, deixar um vestido carmim, transparente, cair sobre o corpo escultural e passear, estouvada de lascívia, nas ruas pejadas de homens famintos. Ou queria apenas exilar-se, ir para longe da cidade que sempre fora a sua. Por cansaço dela. Para fintar o envelhecimento precoce que o espelho diário não mostrava.
Não sabia o queria. prostrada na cama, queria que um desfado lhe saísse em sorte.

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