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Sair ou ficar? O olhar dela perdia-se
no firmamento, no mesmo firmamento onde o sol se confundia com a água tingida
por uma tonalidade laranja oxidada. Parecia, aquele olhar remoto, uma confissão
de perda. Diriam os desatentos, os que passassem por ela como estranhos, que
nas veias fumegavam os vapores da ira. Os ossos do rosto pousados nas mãos, as
mãos como ossos duros que amparam uma árvore centenária.
E ela, indiferente ao que sobrava em
redor, debatia-se em seus pensamentos. Nas interrogações que não ganhavam o
braço às respostas. Revivera o que estava para trás e a inutilidade do que
fizera. Os estudos, as noites perdidas em sabatinas sacrificiais para empinar
calhamaços com saberes áridos, os litros de café, as pastilhas proibidas, os
namorados evaporados porque andaram inimizados com os estudos, as zangas com o
pai que queria que ela fosse modelo, os concertos que riscara da agenda por
causa das noites de estudo, as férias hipotecadas porque o pai deixou de
subsidiar os estudos – e tudo para um nada do tamanho da escuridão toda.
Era um daqueles cursos que fora
promissor, não tivesse ela nascido à tardança para o mercado que se esgotara.
Umas amigas davam aviso: “faz como nós,
emala os pertences e exila-te, que é cá fora que arranjas emprego decente.”
Ela resistia. E o pior é que nem sabia por que resistia. O pai não dava
notícias há meses, a mãe estava emigrada na África do Sul – era o seu fraco
sustento, com o soldo que metia em transferência bancária a cada dia cinco. Os
amigos andavam arredios. Só se fosse pela irmã e pelos sobrinhos, um consolo da
alma. Que, de resto, tirando uns biscates a servir bebidas em bares de
discotecas, o que sobrava era o tempo desocupado.
O exílio era sedutor. Exílio, pois
recuava nas palavras quando lhe falavam de emigração: era exílio, sim senhor, a
fuga necessária para encontrar mantença. Adiava a resolução. E quando a
interrogação angustiante “sair ou ficar” quadrava com o exílio que se antepunha
atrás do sol poente, ainda o dedo segurava o cordel das raízes. Não sabia por
quanto tempo. Por enquanto, e enquanto o exílio soubesse a capitulação, nem
queria ouvir os interstícios do pensamento a repousar na ideia.
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