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Não é quando os olhos outros
podem ser testemunhas, eles acordados a desoras. Não é quando o mundo lá fora
se apronta a ser voyeur. Guardamos as
coisas que são nossas. Nos segredos aninhados no suor das mãos. É quando a
noite se eleva e a vida lá fora hiberna que nos entronizamos reis. Onde o
reinado se acoberta do frio noturno e deitamos a unção maior aos olhos que se
entreolham no frio cais que nos recebe.
As palavras são terçadas no
silêncio ensurdecedor. Quebramos o silêncio com as palavras entoadas com o
sabor do ouro vivido, como se fôssemos o fogo que derrete o gelo contumaz. A
grandeza que procuramos entra pelo quarto. Saímos, metemos os pés pelas ruas
desertas. Um carro agora, outro ali, não há vivalma enquanto erramos com o fado
que soubemos entregar nas mãos salgadas. Às vezes deitamos os olhos ao céu na
demanda de estrelas cadentes que deixem em seu rasto palavras escondidas.
Depressa damos conta da inútil demanda: a lei das probabilidades decanta a
inutilidade. E, fosse como fosse, o achado de um fado no seu tempo desconhecido
é um ultraje ao tempo que temos e ao que nos está destinado.
Sabemos que o porvir conta.
Ele vem domado com o tempo que se consome na voracidade do momento. Como
múltiplos pontos que se tecem no horizonte celeste e compõem o firmamento tal o
sabemos. O encanto do ocaso que tinge o céu com a sua face temporariamente
rubra pressagia a escuridão que é nossa tutora. Não nos amedrontamos com a
noite. Ela traz pela mão, nas horas que se consumirem entretanto, a madrugada
doce dos olhos estremunhados, dos corpos remoçados, da manhã nova que desponta
no céu macio que escorraça a escuridão. E sabemos que é o amanhã que conta,
desde que os amanhãs venham banhados com a macieza de todos os hoje que são o
tempo tomado pelos sentidos.
Por toda a noite dançamos a
dança oculta. A dança que se oculta dos olhares dispensáveis. Somos seus coreógrafos
e dançarinos. Invencíveis na empreitada. E os passos que ensaiamos, os corpos
que se entrelaçam, as palavras acometidas nos sobressaltos ou as palavras
douradas pela irrefreável sede, são o forte que agasalha os segredos de todos
os tempos que interessam.
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