7.1.14

Arrumador de ideias

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Um nevoeiro tremendo. As partículas da condensação, um biombo onde cresce o embaciamento do que vem por diante. Às vezes, sem saber se faz noite ou se o nevoeiro trata de limpar a claridade que pertence ao dia. Um labirinto interminável, sem fio à meada que se veja, troveja pelas entranhas.
É como se dominasse uma sensação idêntica a quem se encontra perdido no meio do nada, sem mapa à mão e sem ter aprendido os azimutes. Os coiotes que vociferam uivos ao longe não são de contemplações quando encontram os imberbes deitados fora na vastidão da pradaria sem vivalma. Se puderem, deitam o dente e não largam mais o corpo até que ele se transforme em carcaça. E os coiotes sentem-se cada vez mais perto, a julgar pela proximidade dos uivos. Pode ser que a lucidez impeça a desorientação. Pode ser que o sangue frio vença o torpor que ameaça tomar conta de tudo.
Por dentro, onde tudo se revolve numa ebulição telúrica, ferve um torpor que se condensa em hibernação. Que pode ser fatal. Não há tempo para o sono, que esse sono pode ser o final. As afiadas facas que adejam no céu, pairando sobre as distantes montanhas que acamam a pradaria, estão vigilantes. Congeminam a vigilância de si mesmo, sobre si mesmo, num desigual combate que caldeia os sentidos. Os suores frios que escorrem pela fronte são mau presságio. É altura de transformar as fragilidades para torcer seu fado e delas fazer antídoto: são as fragilidades que compõem o ânimo que vem a seguir. O nevoeiro que tudo embacia começa a desfalecer. Arrumam-se as ideias a partir da sua desordem. Rombos na cortina de nevoeiro, com o biombo a desmaiar em sua fina porcelana, são o sinal de uma nova temperança. Não foram os mastins a levar vencimento. As afiadas facas ficaram atadas numa contumácia; afinal eram vagas ilusões que adulteravam a nitidez do olhar.
Arrumadas as ideias, desde o mais alto da humilde admissão das fragilidades, sobrava um tempo inteiro por diante.

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