20.1.14

Pelos olhos escuros da eternidade

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Que se ponham as almas de molho. Que estejam preparadas para o ciclone dos sentidos. Não é de um tempestade coloquial que se trata. Não são inconfessáveis as juras que se interiorizam. Em podendo as afetações ser banidas, de onde sopram as hesitações que parecem suicídio assistido? Os olhos ensimesmados rejeitam os festivos estados de alma que a generosidade cambia em troca de nada. O comércio das almas não se compadece com a troca de mercancias com preço marcado. Há só um dar, sem o receber como imperativo sinalagma.
Por todo o lado abundam profetas do infortúnio, que mais parecem profetas da insídia (a começar pela deles próprios). Sinalizam a obscuridade que totaliza o tempo, como se não houvesse tempo soalheiro, ou a luz diurna desmaiada pela teimosia das nuvens que se acastelam como um biombo do céu que se perde na resplandecência do seu avesso. Os seus rostos são um funeral. Só conhecem palavras malsãs, sombras estéreis, o amanho das maleitas, a intriga. Prefaciam o fim dos mundos, que não se demora. Só não sabem se serão habitantes da mortalidade quando o fim dos mundos achar o seu dia, mas pouca serventia tem o oráculo, caso lhes fosse dado a conhecer um que fosse revelador. Prefaciam o fim dos mundos enquanto pressagiam a decadência em estado febril, a incivilidade (dizem, enfáticos), entronizando-se tutores dos bons valores.
Os outros, os que recusam o miserável opróbrio do futuro, encantam-se com a perenidade do presente. Enfeitam-se com coroas de ouro, vestes sumptuosas, ou a nudez dos corpos trémulos; ensaiam estrofes que ao menos são obras primas no seu convencimento; deixam as lágrimas a marejar nos olhos quando os sentidos ensaiam emoções irrefreáveis; servem-se de guarda-chuvas aveludados à prova da chuva ácida que desarranja os campos; as mãos que vêm das algibeiras trazem as pétalas perfumadas com os gestos que são um encantamento. E dizem, sem relutância, que a eternidade não é uma quimera.
A eternidade é o latim dos puros que desafiam os olhares entristecidos sobre o que há em redor. Só os olhos escuros conseguem decantar a eternidade.

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