9.1.14

Às tormentas, dobra-se o braço

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O mar encantador, que tudo pode matar.
Agitam-se as árvores, arqueiam-se seus ramos que fogem do epicentro. O mar molda-se num dantesco quadro. A chuva escorre como se não viesse outra vez o tempo soalheiro. As pessoas perdem o sono, vigilantes sobre os haveres, erguendo trincheiras que julgam proteger da malévola intempérie.
Ao mesmo tempo, sacerdotes das catástrofes recordam que a culpa das tempestades é dos homens – como se fosse mais importante discutir as suas origens em vez de congraçar as consequências, com falta de respeito por quem perde os haveres. Outros, menos doutrinados, lamentam a aziaga natureza. Lembram que o homem leva tempo a embelezar a orla que quase beija as mansas águas do mar quando elas se não descompõem e que, num golpe estouvado, o mar, em íntima aliança com os adversos elementos da atmosfera, rouba o que teve dedo humano. Vertem-se lágrimas por causa da devastação. Maldiz-se o mar que não quis ser sempre benquisto e se amotinou, quase fazendo crer, em coro com os profetas das catástrofes, que foi a paga pela tresloucada sede humana de meter edificações em lugares que qualquer dia podiam ser colonizados pelo mar.
Falta-lhes lucidez, aos profetas das catástrofes e aos que tecem seus prantos e querem baixar os braços. Sempre que uma tempestade muito descompôs, a têmpera humana, que é rija e perseverante, cuidou de reconstruir. No fim das contas, triunfa a sede de empreitada que faz as pessoas meter as mãos ao trabalho, lambendo as feridas que o mar avivou quando se indispôs e entrou, de reboliço, no terreno que se julgava imune à sua inspeção. Pode ser que venham de novo os agricultores das catástrofes reclamar sua razão, protestando contra o desmazelo dos perseverantes por nada aprenderem com as catástrofes havidas. Até podem adivinhar que, mais tarde ou mais cedo, o mar volta a invadir a quietude que assim se julgava, numa sanha destruidora que devolve ao mar uma covardia escondida.
O que interessa é que as tempestades não são definitivas. São uma curva traiçoeira que arrebata uma trama dramática. Descontando as vítimas que perecem na fúria de uma tempestade, estamos cá todos, os da larga maioria, para reaprender com os destroços.

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