Trentemøller,
“Still on Fire, in https://www.youtube.com/watch?v=_mfIkMMyHcs
Reunidos em conclave, os
movimentos que defendem os oprimidos contra a ganância do lucro constataram a
patifaria dos anos bissextos. De nada valeram explicações científicas de físicos
do tempo convidados para o conclave, quando explicaram, com o rigor da ciência,
o acerto matemático que a roda do tempo exige a cada quatro anos. Essa era, no
fim de contas, mais uma teoria a soldo dos interesses do grande capital. De
quatro em quatro anos, os trabalhadores tinham de oferecer um dia de trabalho
ao patronato – o excecional vigésimo nono dia de fevereiro.
Primeiro, tratou-se de
cobrir de chacota os físicos do tempo que mal adivinhavam ao que iam. Assim
como assim, os superiores interesses dos trabalhadores devem-se sobrepor (por
isso são superiores) ao resto. Até à própria ciência. Aos que objetavam que a
ciência era objetiva, e que trazia lustros de conhecimento arrematado por
crânios sapientes, contrapôs-se, sem direito a contraditório, que a ciência era
de uma objetividade que escondia o patrocínio dos interesses nocivos dos que
sempre lutaram para terem ao seu dispor um exército de mão-de-obra barato e frágil.
Segundo, exigia-se ação
no terreno. Já que os direitos dos trabalhadores são uma sequência de pequenas
proezas conquistadas aos tiranetes do capital e seus lacaios (o poder
político), a supressão do vigésimo nono dia de fevereiro teria de ir parar à
agenda das reivindicações. Se o poder político e os patrões recusassem o revisionismo
do calendário greco-romano, e se não ditassem cárcere para os físicos do tempo a
espernearem em jeito de protesto, os sindicatos, os partidos democráticos e os
movimentos com o exclusivo da análise verdadeira e das causas justas
decretariam luta ao dia suplementar dos anos bissextos. E já que os anos
bissextos são a cada quatro anos, para a causa não cair em hibernação
criar-se-ia o hábito de uma greve geral no vigésimo oitavo dia de fevereiro em
homenagem à dissolução do vigésimo nono dia desse mês quando o há.
De seguida, os
sindicatos, os partidos democráticos e os movimentos com o exclusivo da análise
verdadeira e das causas justas partiriam em demanda de outra causa justa. E
assim sucessivamente. Até que, por fim, não houvesse ricos (pois os ricos
querem trabalhadores mais pobres e vulneráveis), por a sua fortuna ter sido
nacionalizada ou por terem acabado os seus dias num cárcere escuro, húmido e
insalubre, em nome de uma justiça divina escrita por timoneiros do momento.
Nesse dia, seria dia todo
o dia (sem ser necessário ser junho em terras árticas).
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