8.4.15

A um deus desconhecido

Sétima Legião, “Pois que Deus assim o quis”, in https://www.youtube.com/watch?v=nI7lmfOeUlM
Por ele, muitos tiram vidas. Muitos se abespinham quando o seu nome é invocado em vão. Muitos se persignam, tementes a uma força superior. Outros descreem. E outros, ávidos de uma explicação para a ordem das coisas, não se resignam perante a sua desobediência divina e acreditam que uma centelha os há de colocar na senda de deus.
E, todavia, disputa-se a identidade de deus. Na sua imaterialidade – dir-se-ia –, não quadra com a identificação, como se localiza a identidade de uma pessoa comum. Na senda de um deus por ora desconhecido (e sem garantia que venha a perder essa condição), não aceitava os dogmatismos vários que ensaiam a obediência a deus. Ele julgava que deus podia ser diferente a diferentes olhares. Numa rara epifania para um agnóstico, julgou que deus podia (ou devia) ser a personificação de cada indivíduo. Seria como se as veias de cada um estivessem tomadas pelo seu pessoal deus, uma imagem fiel da bondade que fermenta, em matéria potencial, nas funduras de cada indivíduo. Contou a teoria em público. Julgaram-no herege, uns; outros atiçaram-lhe a demência, pois só um insano podia desafiar as ideias cosidas acerca da impersonalidade, da imaterialidade e da indivisibilidade de deus.
Não desistiu. Não aceitou que os outros impusessem a sua deificação. Para não voltar ao início: à observação terrífica que deus, nas suas diferentes encarnações, era fonte de cisões, um leito de violência soez, um amplexo de pensamento totalitário. Um agnóstico ainda mais empedernido perguntou-lhe, importunado com a demanda, por que artes se movia em tão metafísicos terrenos: “para um agnóstico, a questão de deus não se coloca. Em não admitindo a sua existência, nem devemos pronunciar o seu nome. É uma inexistência. Por que teimas em tão conturbada demanda?” Supondo uma usurpação da sua liberdade de pensamento, não ensaiou resposta. Tomou o interlocutor como gente da mesma igualha dos fanáticos das religiões.
Ainda que deus continuasse desconhecido, a dúvida metódica (talvez a verdadeira categoria deificada) impedia o esgar monolítico do amigo que exacerbava no agnosticismo. A única recusa era recusar as possibilidades. Todas. Até a de que houvesse um deus algures, um deus de visitação futura (porventura). Um deus, por ora, desconhecido.

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