Anne
Clark, “True Love Tails”, in https://www.youtube.com/watch?v=8rl8-Yo2W5U
O
secretário de Estado era o mais popular do governo. Entre o público feminino (e
algum público masculino que escondia identidades no armário). Não se distinguia
no exercício da governação. Era banal. O que, entre a mediocridade impante,
constituía elogio.
O
secretário de Estado animava a excitação do público feminino (e de algum público
masculino homossexual) pelo charme. Não era habitual nas personagens políticas,
normalmente mais dadas à feiura. Era alto, magro mas atlético, bem parecido, o
cabelo sempre impecavelmente escanhoado deixando à mostra os cabelos grisalhos
que começavam a povoar as laterais, os olhos encovados ressoando a mistério. Não
se conheciam amores recentes, nem se sabia que partilhasse a vida com alguém.
Diziam as secretárias do ministério, entre dois suspiros, mal empregado o
secretário de Estado ter escolhido a solidão. O que, ao mesmo tempo, incendiava
as esperanças das senhoras, desde as solteironas involuntárias a outras a
atravessarem crises conjugais e àquelas que sonhavam com uma simples aventura tórrida.
Eram elas que privavam de perto com o secretário de Estado. Que iam à vez
servir os quatro, cinco cafés que o secretário de Estado bebia ao longo do dia.
Cá
fora, o homem não era indiferente ao restante mulherio. Algumas coquetes,
sempre com presença social e, portanto, ávidas das mais recentes frivolidades
na comunicação social do género, começaram a ver noticiários e a ler jornais
outros que não cor-de-rosa. As tias começaram a ser presença assídua nos
lugares que, constava-se, eram frequentados pelo secretário de Estado. Correram
notícias que algumas, mais desavergonhadas, assediaram indecentemente o secretário
de Estado. Incomodado, reviu os hábitos.
E
até algumas militantes das esquerdas abdicaram de preconceitos e tinham sonhos
molhados com o secretário de Estado. Começaram por não o admitir, nem sequer no
seu íntimo, pois mulher de esquerda que se preze sabe que não se pode enamorar
por homens de direita. E sabem, dos catecismos absolutos que as doutrinam, que
os homens de direita são sensaborões e pouco sabem da poda. Os ais pesaram mais
que os preconceitos. Algumas esquerdistas destacadas viram-se em maus lençóis
junto dos camaradas (porventura por ciúmes, porventura por preconceito, ou por
ambos os motivos).
O secretário de Estado
teimava em estar sozinho. Corriam rumores que o homem arrastava a asa só para
relacionamentos fugazes, só para alimentar os prazeres carnais. Mas eram só rumores.
No dia a seguir à tomada de posse do novo governo (do partido rival), o secretário
de Estado foi apanhado por paparazzi
numa ilha grega. Ficou-se a saber que era da mesma cepa do Luíz Pacheco. E as
mulheres todas, a uma só vez, ficaram a saber quem tinha sido Luíz Pacheco e
entornaram a desilusão do antigo secretário de Estado.
Sem comentários:
Enviar um comentário