The
Durutti Column, “Without Mercy, 1” in https://www.youtube.com/watch?v=qwEBzhEpr1M
Na repristinação do tempo
mortiço, uma interrogação axial sobre o eu que há em mim. Gaste-se o tempo que seja
tomado como necessário para alinhavar uma réplica. A que merecer ser suturada
pela mão do cirurgião de almas que há por dentro de mim. Oxalá a demanda não
seja infecunda, caso em que a orfandade identitária pode ofender o bom juízo e
o juízo restante se perca por aí, entre o orvalho matinal e a penumbra da noite
madraça.
Quem sou eu? Uma
tentativa: torrente de lava incandescente. Ou areia movediça de um deserto
imprestável. Ou água, ora devolvida em iracundas ondas, ora espreguiçada em
plano espelho onde se deita o sol que lhe empresta vestígios prateados.
Um colóquio de estados de
alma, variáveis como a luz das estações, inerte à medida que a contumácia do
tempo se emoldura na maciez das poeiras gastas. Ou a tangência às almas
exteriores que são imediações, na recusa do ensimesmar que não desvenda sendas
de brio próprio.
Um mapa de livre acesso,
na convocatória da transparência, quando a transparência é metódica regra de
convivência com a exterioridade. Ou uma ilha inacessível aos olhares alheios.
A tradição das tradições,
soez maltrapilho que esbulha a altivez da alma. Sem antítese admitida.
O músico sem saber
música. O consumidor de artes sem desiderato outro se não cultivar a alma
desarvorada de demónios diversos, sobretudo dos que povoam pesadelos habituais.
Um corpo pequeno do
tamanho dos mares, pelo menos na viçosa tela das intenções. Ou generosidade com
freio, quando se atamancam feitos que se julgam proezas que, todavia, o não
são, expondo as imensas fragilidades da espécie que nelas se não revê.
Uma montanha frondosa,
com encantadores regatos a sulcarem vales que irrompem pela serrania abaixo até
alimentarem mansos caudais. Ou rochosas escarpas, os precipícios medonhos que
ameaçam a calma dos tempos amenos com farpas de granito ávidas de trespassar a
carne.
Uma pauta com notas
congeminadas numa melodia ímpar, uma melodia que cativa a atenção dos rouxinóis
cantores. Ou uma folha teimosamente em branco, sem serventia para uma – uma
sequer – nota ou palavra que derrote o silêncio que acomoda a letargia.
Um mar que chama por
companhia. Uma companhia que sou, porventura, sofrível. O tutor do amor
singular, em desordem com os servos do desamor. Porventura, em instantes,
estimável. Um poço sem fundo, que arroteia as estrofes que levitam das
profundezas da água até ascenderem à superfície, só para verem as cores do
mundo. Ou a superficialidade da pele quente para desembainhar a proteção da
alma.
E um palimpsesto dentro
de mim (ou por dentro de mim).
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