Eagulls,
“I Wanna Be Adored”, in https://www.youtube.com/watch?v=DE4oFpeaczM
Pobres dos que se
certificam a si mesmos matéria central do universo. O resto é que são ilhas.
Neles convergem as forças, não descurando de banalizar os atores adjacentes.
Epítomes de uma refulgência admirável, como se tivessem nascido untados de
ouro. Ou como se sobre eles adejasse uma aura muito especial, predestinada
gente que tem sempre a derradeira palavra, arrebanha para si o monopólio da
razão e destitui quem bolçar adversativas reduzindo-os a um nada humilhante. Admita-se
que é gente que acorda a cogitar como são entidades centrípetas. A eles tudo
atrai – mas tudo o que tiver pergaminhos elogiáveis, que as excrescências são
depositadas na gente vulgar sem estaleca para entrar no Olimpo dos escolhidos.
E, todavia, mal sabem que
não passam de peões. Como todos somos, peões num imenso tabuleiro onde se jogam
as peças de um xadrez perene. Uns poucos, a quem o poder se abraça ao regaço,
manobram as peças. São esses que pairam dois patamares acima dos demais. Até
dos que puxam lustro à sua magnificência e compulsam para si mesmos um estatuto
que, ó contristado fado, só existe dentro das suas cabeças.
O dia chegará em que as
ilusões esbarram num fim. Para alguns seráficos do eu incomensurável, tal dia
já terá chegado. Não terá sido fácil suportar a dolorosa campa da realidade:
afinal são tão pequenos como os meãos de quem se julgavam matéria superior.
Porventura escondem o dia em que a purulenta realidade lhes bateu à porta.
Insistem numa ilusão, desta vez agravada: pois dantes, ao menos, julgavam de
espírito convencido que eram peças especiais; agora, que sabem que são tão
ornamentais como o vulgar peão, tratam-se como os avestruzes (e metem a cabeça
na areia). Oxalá não morram sufocados com a areia imprópria para nutriente.
Outros, a quem a tesoura
tenebrosa das coisas como são ainda não sondou, estão em lista de espera. Não
irão escapar a este sabre. Ficarão a saber como doem os precipícios quando
neles se entra em queda livre. A dissolução das ilusões a seu próprio respeito
tratará de arranjar o desiderato. Ao tomarem conta que o pergaminho especial
lhes foi negado, e ao saberem que afinal são tão peões como o mais vulgar dos
peões, sentirão os ossos estalar no fim do precipício. Dor que, convém dizê-lo,
jamais será sentida pelos peões autênticos. Pois por o serem – e por saberem
que o são – não experimentam as calosidades de precipícios assim.
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