Tindersticks, “Another
Night In”, in https://www.youtube.com/watch?v=Nh7QuDWsVgQ
Uma rosa desmaiada nas areias entronizadas pelo ocaso. Arqueada
sobre o dorso, o do lado esquerdo. Perdera a cor, já baça. Sinal da decadência outorgada
por quem a prendeu às areias alisadas pelos ventos invernais. Alguém apoderado
pela melancolia, na foz do desamor. Sem saber que fazer, as noites ainda
mencionadas pelo algoz das insónias, visitou a praia sem gente e depôs a rosa. Em
forma de luto, ou em forma de chamamento do amor desavindo, ou – ainda – como
tributo à mulher sem correspondência.
A rosa deposta nas areias frias, um ato de desespero. É preferível
crismar as areias com o sangue da melancolia do que meter os pés pelo areal e
entregar-se ao mar enfurecido. Enfiou a cabeça entre os joelhos enquanto
respirava a solidão da noite. Podia fugir dos descaminhos que o apoquentam, houvesse
vontade e se se convencesse que há outros males, esses sim, sem remédio. As
dores que abrem feridas excruciantes não são domáveis. São como as ondas
tempestuosas do mar que se esmagam nos rochedos torneados pela erosão.
Mas a vontade não tem freio. Mete-se numa clepsidra sem
água, os corredores do labirinto sitiados pela mágoa que consome a carne e a
deixa exangue de forças – a vontade reduzida a um vestígio. Talvez a rosa
deposta fosse uma centelha à espera que uma divindade também sem sono tomasse
nota da angústia e congeminasse os elementos para mudar o fado. Do fado que,
antes de o ser, quando ainda havia uma labareda projetada sobre o devir, era
uma quimera prometida. Mas o fado, depois de ser emoldurado nos livros de
registo que acomodam as memórias, fora, as mais das vezes, um desengano.
Havia muita fraqueza. A cabeça pesada pelas insónias e vigílias
sem cabimento cedia o passo à prostração. Não queria saber das horas cruas que
teriam o selo de um fado posterior. Não queria saber de mais nada. A rosa
enterrada na areia, com um gesto macio, era o derradeiro sinal que queria
enviar às divindades de atalaia no turno da noite. Não queria saber dos significados
do gesto; os lugares-comuns diriam que a rosa a murchar era a imagem de quem a
depôs. Também não queria saber das represálias do porvir, quando os dados
fossem lançados e os ponteiros das bússolas encontrassem afinação.
Sobrou a rosa desmaiada e as mãos enregeladas pelo vento
traçado pela penumbra sem fim. Um dia vinha depois.
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