11.7.16

Quem confia no mundo?


Querem as coisas translúcidas. Que sejam destapados os véus que embaciam os olhares. O mundo precisa de reinvenção – diz-se à boca pequena. Está podre. Está podre? O que devemos fazer para livrar o mundo dos bolores que o afeiam?
Ou, talvez, a demanda nem se deva colocar. É empreitada desajustada. Nenhuma alma sozinha pode pretender os louros de uma metamorfose tão robusta. Dir-se-ia: e a espécie como um todo? É um logro esperar que tal se possa passar. As pessoas pensam no heterogéneo, agem na multiplicidade dos padrões que são peça da maravilhosa engrenagem da subjetividade humana. Não se espere que o mundo deixe de lado as suas podridões. Não haverá concordância sobre o procedimento para limpar as suas impurezas. Nem sequer haverá concordância que o mundo esteja açambarcado pelas podridões que contracenam.
Se os bolores segregam a beleza do mundo, o que se pode fazer para repor alguma sanidade? Ponha-se um tapume a cobrir as fealdades do mundo. Dirão que não é acertada medida. Que apenas trata de mascarar as degenerescências incómodas, não cuidando de reparar os males que são mais fundos e exigiriam conserto. Não importa o que digam. Importa o que se congraça nas baias do pensamento. E se o pensamento mandar cobrir as fealdades que sobressaltam a lhaneza do mundo, arranje-se expediente que desça um pano sobre o mundo em forma de seu arremedo.
E o pano que se mostra pode ser, ele próprio, um trapo imundo, um simples remendo que, em sendo sujo, não consegue disfarçar as impurezas que coalham o mundo. Talvez não interesse, também. O mundo está embebido numa inata imperfeição. E nós, espécie geneticamente imersa numa imperfeição maior ainda, não devemos descer o pano sobre o mundo. Haja franqueza de olhar de frente as fragilidades que, por o serem, nem sequer deviam ser defeito, ou desafio. Assim como ao mundo.
O pano descido sobre o mundo não é cura; é ilusão que esconde um espelho de espelhos irradiando sombras que embaciam a lucidez dos olhares. E que nos deixam sitiados perante fraquezas que agem como prisões dentro de nós. O pano sobre o mundo é um ardil.

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