Darkside, “Paper Trails”,
in https://www.youtube.com/watch?v=PAAUqBghiVo
Ilhas à deriva
procuravam um lugar onde pudessem ser, enfim, tenentes. Erravam, sem lugar que
conseguissem encontrar. Apoquentavam-se. Se não encontrassem um cais para
lançarem âncora, não teriam um sítio no mapa. Tementes de ficarem excluídas da
cartografia, ilhas tropeçando nesta adversidade procuravam quem lhes
aconselhasse um método para não ficarem irremediavelmente perdidas. Alguém que
lhes ensinasse como encontrar o chão liso entre as águas tumultuosas que
teimavam em persistir.
Pediram conselho a um
alfaiate das capacidades que as capacitasse a encontrarem um lugar no mapa –
ou, ao menos, a desenharem um mapa só para elas. O alfaiate era bom ouvinte.
Fazia parte das funções: não podia sugerir um remédio para as capacidades
demandadas se não soubesse antes o diagnóstico da ilha sentada diante de si.
Tinha de as ouvir, pacientemente, com critério, tomando notas e, à margem
delas, fazendo comentários preliminares que serviriam de pista para a
prescrição.
As ilhas flutuantes
aceitavam entregar-se incondicionalmente à intuição do alfaiate das
capacidades. Porque tinha de ser assim, sob pena de não se encontrarem por
dentro de si mesmas. E porque o alfaiate das capacidades transbordava serenidade
inspiradora; era fácil a qualquer ilha desajuizada confiar no alfaiate das
capacidades. Por todo o lado, o perito era credor de elevada reputação. Ilhas
dantes perdidas (mas agora ancoradas a um ponto no mapa) eram pródigas em
encómios. Assim como assim, a gratidão exige um penhorado reconhecimento de
quem ajudou a curar tão estrutural fraqueza. A agenda do alfaiate das
capacidades estava a rebentar pelas costuras. Generoso, arranjava sempre um
pedaço de tempo para receber mais uma ilha desapossada de firmamento.
Um dia,
descobriram-se podres terríveis ao alfaiate das capacidades. E quase toda a
gente desmentiu a sua reputação, virando-lhe o rosto quando com ele se cruzavam.
Perdeu quase todas as ilhas errantes que tinha em carteira. Menos um punhado
delas, e uns raros membros do grupo em redor, que sabiam separar as águas. O
alfaiate das capacidades não tinha as suas capacidades diminuídas mercê dos
privados vícios que mereciam censura social. Continuava a ser perito. E a ter
direito a uma vida própria fora do castelo edificado onde curava as ilhas à deriva.
Não interessava que o alfaiate das capacidades estivesse amordaçado à sua
própria ilha à deriva.
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