11.10.16

Abanar a cabeça

Hot Chip, “Over and Over”, in https://www.youtube.com/watch?v=k2n8CDPuZjg
Não no sentido de quem se excita ao coreografar a música que aparece ali em cima, ao ponto de exibir uma dança, desconchavada ou não (que o mérito da dança não vem ao caso). Abanar a cabeça, no sentido literal da expressão; abaná-la para a chacoalhar só para perceber se de lá se extrai uma ideia que tenha merecimento.
Há milagres, por vezes. E gente que deles carece, na escolha de quem passeia uma avantajada dose de bertoldice. Apedeutas sem remédio? Não haja tanta descrença nas possibilidades da espécie e dos seus intérpretes. Haja a perícia para desatar dois ou três parafusos que entreabrem a cabeça dura como um pedaço de fibra de carbono (que, julgo, ser da matéria mais contundente). Porventura, um panorama desolador. Faz lembrar aquelas paisagens desérticas – sem gente, sem vegetação e apenas com um imenso nada em redor. Lugares não frequentados por membros diligentes da espécie. A portinhola da tola ainda aberta e, diante da consternação que se expõe, não se pode desistir a empreitada. Antes que entre poeira – por tóxicas propriedades que possa conter; o que, em abono do rigor, não faria grande dano em cabeçorra com tanta vacuidade por dentro –, melhor remédio será fechá-la antes que seja tarde. Antes que venham especialistas de outra larva recomendar internamento onde se curam distopias do comportamento.
Fechada a tempo a portinhola da tola, ato contínuo a sua deposição nos tentáculos de uma máquina poderosa, como se fosse uma terapêutica montanha russa, que deitará tal cabeça do avesso. Logo a seguir, provoca nela um efeito telúrico, exposta a um terramoto de que se espera povoar a cabeça dantes inane com um módico de pensamento inteligível. Literalmente: abanar a cabeça. Arruinar as teias de aranha por dentro, talvez a única substância por entre tanto nada. E esperar que no fim da função, os olhos raiados (um custo necessário) deponham a agnosia militante.
Como somos possuídos por um (ao menos) mínimo denominador comum de esperança, pode ser que no fim da função a cabeçorra sujeita ao processo de interna centrifugação (para ao menos arejamento de processos cognitivos) comece a pensar. Nem que seja ligeiramente.  

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