Scarlet Johansson, “Boys
Don’t Cry”, in https://www.youtube.com/watch?v=ChkmcIlCmpU
Não é síndrome de Calimero: não imploro comiseração do
leitor(a), por mais que o(a) leitor(a) já tenha, apressadamente, concluído,
pela leitura do título, que vou choramingar por ser rejeitado pela sociedade. Não
é o caso. Só me considero rejeitado por uns grupos específicos, que ou me
julgam irrelevante ou devem achar que sou invisível, tamanha a indiferença que
neles causo em contraste com a atenção que dedicam a (quase) toda a gente à
minha volta. E para que não sobrem dúvidas, e como começo de conversa, digo em
minha defesa que esta é uma rejeição que me compraz.
Primeiro exemplo: os que propalam a “palavra do senhor”,
na versão testemunhas de jeová. A modernidade trouxe as virtudes do marketing, desfazendo o atavismo com que
perseguiam potenciais fieis. Agora, já não é só o porta-a-porta que conta. Montam
estendais à porta de centros comerciais e, no tempo estival, à entrada de
praias. Das vezes que passei pelos escaparates das edições testemunhas de jeová,
onde sempre estavam presentes dois zelosos divulgadores da “palavra do senhor”,
em algumas delas dirigi olhar atencioso para os militantes da causa, como quem
clamava por um quinhão da sua atenção. Mas eles e elas não davam conta do meu
interesse. Tirei uma conclusão: os propagandistas de jeová devem ser educados com
dotes sobre-humanos de adivinhação. Desprezam o meu olhar – como direi? –
curioso (falazmente curioso). Deve-lhe ser dado a saber do meu ateísmo.
Segundo exemplo: em aeroportos e em certos comerciais
(outra vez), há uns púlpitos que albergam duas ou três senhoras que angariam
clientes para um cartão de crédito. Em algumas vezes, apeteceu-me usar o método
adotado para os testemunhas de jeová. A mesma resposta: total indiferença. No caso
das angariadoras de clientes para o cartão de crédito, sobejam mais dúvidas na
hermenêutica dos factos. Não sei se as senhoras me acham um cidadão remediado e
com ar de quem transpira dívidas, não sendo o cliente que estão instruídas a
cativar. Ou se tenho um ar – como direi? – elitista, o que desqualifica, por
excesso de atributos, do cartão de crédito. Ou se, apenas, também foram
treinadas para desenrolarem um oráculo à frente dos olhos e adivinham que sei
que aquele cartão de crédito cobra taxas proibitivas. Ou, por fim, adivinham
que estou servido desse material.
Nestes dias em que me destinam desta indiferença, chego
a casa com a alma cheia.
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