25.10.16

O único diamante

You Can’t Win, Charlie Brown, “Pro Procrastinator”, in https://www.youtube.com/watch?v=NTdxk9neyuQ
Uma cortina de sombras e um engano tremendo. A cortina de sombras extinguia o olhar sereno que se requisitava para ponderações mais lúcidas.
Talvez uma chuva prolongada e intensa fosse a caução desse intervalo heurístico. À procura de uma paisagem talvez perfeita. À procura de uma geografia inexperimentada, como prova de vida ou então como memória futura. Sem saber ao certo o que procurar, sem saber o que seria a demanda sem um esgar depreciativo que convoca o lado oculto entretanto destapado. Pode ser que haja um diamante singular entre a areia dominante. Pode ser que o deserto seja apenas uma extensão da febril imaginação que desmata as camadas que se sobrepõem num meândrico quadro de cores e formas.
Uma voz sem rosto sussurra, em surdina, que pode haver quarenta maneiras diferentes de entender o quadro. Pelo menos. Talvez seja melhor a quarentena do pensamento. Talvez seja melhor procurar desenhos da simplicidade. Não: o pensamento não se tornou ocioso. Há alturas em que um cansaço profundo, estrutural, é o autor da pilhagem da força precisa para empreitadas árduas. Dirão, em forma de interrogação: não é crime meter um severo bocado do pensamento em quarentena, deixando-o ao desbarato, num limbo sem utilidade? Não será assim se, entretanto, o diamante singular for achado. Não será assim se o olhar se encontrar com o pavio que é promitente desembaraço de portas teimosamente fechadas, desencravando-as das fechaduras oxidadas pelo desuso.
As mãos deitam-se à areia. Não importa que o sol esteja a pino e faça um calor asfixiante. Entre o que não se deita na poltrona do adiamento, está remexer na areia, o tempo que for preciso, para achar o único diamante. Como se as mãos estivessem sedentas de mexer nas fundações profundas. Como se fosse preciso um novo azimute que garante um esteio reinventado. O diamante único presta-se à função. O diamante único trouxe um inesperado cumprimento: provou que o amor não é injusto (como os prantos dos herdeiros do desamor não se cansam de se condoer).

Sem comentários: