Sigur Rós, “Varðeldur”, in https://www.youtube.com/watch?v=_TsQ8lIkzzQ
De um estúdio sobranceiro à mais bela paisagem,
debruçado sobre o mundo, como se fosse possível tê-lo no amplexo dos braços.
E dizia, em discurso metodicamente espontâneo, que tudo na
sua igualha seria pontuado pela diferença. Um lugar heterodoxo, mesmo por fora
das heterodoxias que, de tanto assim se proclamarem, depressa se investem em
candidatas a ortodoxias – e depressa chegam ao desiderato de o serem. Um mundo
abraçado pelas suas bainhas, na congeminação dos rostos límpidos, das palavras
sem segundos sentidos nem entrelinhas ou interrompidos desaguares, dos espaços
abertos sem buracos negros em forma de disfarçados alçapões, um lugar
singularmente povoado pela névoa perfumada pelos odores sublimes. E ter a
madrugada como madrinha modesta de uma partitura delicodoce, na coreografia dos
dedos por harpas semeadas num jardim onde se dispunham os fragmentos da
liberdade na relva imaculadamente verde. E depois olhar para o céu, onde o sol
embaciado por uma fina camada de nuvens teimava em acenar um adeus que não era
despedida, antes uma mnemónica estatutária para a coluna vertebral continuar retesada
diante das adversidades. E as pessoas todas numa coletiva embriaguez de confiança
mútua, sem ser preciso escrever regras impositivas em tábuas de pedra ou ditar
proibições ostensivas.
Um mundo novo. Encantador. Cerzido com os olhos
embebidos em curiosidade intelectual. Cheio de artes e sem pejo pelas artes. Destituído
de medo. Um lugar onde todo o ar é respirável. Onde não há a sanha destruidora
que deixa um vestígio de autofagia. Ao contrário: onde tudo é laivo
construtivo, onde o único pessimismo permitido é o que consome o pessimismo por
dentro da pele – como se, numa operação aritmética, a subtração dos contrários
fosse sua anulação. Um mundo novo, opulento – na opulência de furtar sem temor
tudo o que tem para legar.
Um mundo cheio de orgulho, onde as pessoas se deitam e
depois do sono não sabem o significado dos pesadelos, por sua ausência na insubordinação
do sono temperado pelas nuvens leves onde se deita. Num ribombar de tambores
distantes, a chegarem desde um ermo para coroarem uma melodia edificante que só
estava à espera de uma ossatura. Da ossatura firme onde ganham esteio os
fundamentos de tudo.
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