11.11.16

Velhos

At Freddy’s House e Cavalheiro, “Quero é Viver”, in https://www.youtube.com/watch?v=ApbrdzlBHbU&feature=autoshare
Não sei se hei de ir para velho. Não sei se quero as dores de uma velhice tomada pela penumbra contristada. Não sei se quero olhar para o corpo e não o reconhecer. Não sei se hei de tolerar as aptidões a caminho do esquecimento. Não sei se quero esbarrar no pensamento amputado.
Às vezes, tenho a impressão que não devo nada ao futuro. Às vezes, incomoda-me a espada que se joga sobre a cabeça com o penhor do passado – como se o passado fosse a medida meã do diadema por onde há de ser povoado o porvir. Espera-se sempre um amanhã. E enquanto se espera, enquanto não se é tomado pela dilação das promessas sem fundo, está-se num limbo que contamina a riqueza da alma.
Tenho medo de envelhecer? Não devia ter medo. No relógio do tempo resplandece uma tese: a vida é o bem maior, e por mais tempo que a vida leve mais se leva do tempo connosco. Envelhecer é uma dádiva. Não se dá conta da dádiva a não ser quando se esbarra em inesperados, extemporâneos cerceamentos da vida, quando a vida de alguém foi tirada muito antes do tempo. Protestamos, prostrados: terá sido cedo de mais. Em convulsões com as consumições interiores, só então se aprecia a virtude de ser velho. Porventura, não interessa a decadência do corpo, as rugas que se somam e obnubilam do rosto as marcas de outrora. Não interessam as capacidades perdidas. Não importa que o pensamento não seja ágil como dantes. A curva que se deita no horizonte é um perfeito ocaso. Seria lugar-comum dizê-lo, irrecusável.
Porventura, o segredo está em derrotar campos estéreis que se agigantam diante do olhar assim que a velhice se destapa no oráculo dos tempos. Recusando estima às fontes de decadência, tendo-as por indeclináveis; e aproveitando todo o sumo legado pelo tempo. Para tornar todos os amanhãs num momento singular, esvaziando do bornal do tempo as consumições feitas de que somos paradoxais fautores. Viver. A maior riqueza. Com as marcas do tempo que se cicatrizam na decadência do corpo, nas capacidades exangues, no pensamento furtivo.

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