10.11.16

Tubarões

Hanni El Khatib, “Fuck It. You Win”, in https://www.youtube.com/watch?v=R9TUnpOsO7k
E Trump ganhou. Contra as previsões. Contra as preferências de tantas pessoas que temem um candidato – há que dizê-lo – lamentável, desbragado, desnecessariamente polémico (visto pelo prisma de quem vai ser presidente do país mais poderoso do mundo), das pessoas que temem a incerteza que vem atrás de Trump. Um autêntico tubarão que não escondeu ao que vinha durante a campanha eleitoral.
Tubarão, como todos os tubarões que, no exercício da sua liberdade de expressão (há que o dizer também), mostram a sua tremenda desilusão. Tubarões que acusam os eleitores que escolheram Trump: “como é possível?”, perguntam uns; outros concluem que os eleitores que votaram em Trump são tão perigosos como o candidato em que votaram; outros, fazendo juízos de valor (“os americanos são burros”) que os colocam ao nível da incontinência verbal de Trump. Multiplicaram-se os mastins que se atiravam contra Trump. Esta eleição parecia apenas um exercício para impedir Trump. Quase ninguém explicou as vantagens de Hillary Clinton (a não ser a mais óbvia: ganhasse Hillary, não teríamos de aguentar Trump). Anónimos com o direito a cinco minutos de fama mostravam incredulidade: como é possível que Trump tenha chegado aqui? Como é possível que tantas pessoas o apoiem depois de tantas boutades, depois de tantas declarações controversas em que amesquinhava etnias, mulheres, homossexuais? Como é possível haver manifestações de apoio a Trump?
Depois de tanta histeria contra Trump, julgo perceber algum do voto no candidato. É o princípio de Peter aplicado a uma eleição. Quando uma imensa vaga de fundo se mobiliza contra um candidato e quase se esquece da candidata rival, é provável que muita gente reaja contra o clamor mundial de quem, se pudesse mandar, teria proibido a candidatura de Trump – ou, em sendo isso impossível, esforçar-se-ia por proibir o apoio a Trump.
Eu tenho tanto medo do Trump-tubarão como dos tubarões anti Trump que se abespinharam dias a fio com a possibilidade de Trump ganhar as eleições. Incomodam-me os tubarões que discorrem abundantemente sobre a patética figura e os riscos que transporta para a ordem mundial. Sinto-me ofendido com a vontade manifesta, caso pudessem mandar por um dia, de se proibirem manifestações de apoio a Trump – pois esses não sabem o que é a liberdade, nem sabem que o gosto pela liberdade comporta, como ingrediente, dar a liberdade de expressão aos adversários, mesmo quando se sabe que se fossem os adversários a terem o poder na mão, provavelmente o mesmo direito seria cerceado. Incomoda-me ouvir alguém atirar-se a Trump acusando-o de ter dito de uma ex miss mundo que tinha a inteligência de uma dona de casa, esquecendo o que o Dr. Soares comentou sobre o discurso da deputada do Parlamento Europeu (Nicole Fontaine, que o derrotou na eleição para a presidência daquela instituição) era próprio de uma dona de casa.
Ou aprendemos que uma eleição é uma eleição e que temos o dever de respeitar os resultados, por mais que nos desagradem, ou somos fautores de um dos piores atropelos à democracia de que nos dizemos tutores. De Trump, um autêntico tubarão que não escondeu ao que vinha durante a campanha eleitoral, espero que se esqueça de muito do que prometeu na campanha. Como habitualmente acontece com os políticos que ganham eleições.

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