Tricky, “The Only Way”, in https://www.youtube.com/watch?v=kX3JCrEs_qw
Convocam-se os generais embelezados
para emprestar solenidade à função. Descobre-se, a meio da dita, que são
embalsamados. Não podiam sequer mover um dedo caso um forasteiro incomodasse a
soberania que os generais juram defender pela morte, se preciso for. Pois parece
confinado a este resultado a hipótese de a brava nação ter de guerrear com
outras.
Só a auscultação da hipótese revela
como as tropas e generais e toda a hierarquia castrense são coisa datada. O anacronismo
ajuíza a farsa em que se movem. Mas a brava nação precisa de ostentar medalhas
para o povo atestar o sossego que os cobre (nação e povo, na indistinta confusão
em que o segundo é doutrinado pela primeira). Falta elaborar o raciocínio: quem
se daria ao trabalho de perpetrar uma invasão territorial, se o que temos é tão
exíguo e desinteressante? A farsa não reside apenas na sobrevivência de um
escol castrense que habita nos segredos bem guardados dos quarteis, como se
fosse um retiro monástico, com direito a linguagem codificada e a rituais que
perfilham o seu quê de místico, ensaiando jogos em que se simula a dececionante
verve bélica dos seus mais elevados patronos.
Falta continuar a elaborar o raciocínio:
quantos dos tributos confiscados aos súbditos alimentam esta força farsante? Haveria
algum préstimo da força armada caso a brava nação acordasse apoplética com uma invasão
do território? Não se pode continuar a elaborar o raciocínio. Primeiro, a
doutrina zelosamente ensinada logo na escola convence que a proteção da brava
nação contra possíveis guerras exige a incorporação de pressupostos que não
admitem discussão. Têm tanto de lugar-comum como de tabu. Segundo, no reino dos
imperativos categóricos, em que as coisas são ensinadas sem haver lugar a espírito
crítico, não se admitem perguntas que incomodem o estabelecido. O lugar desta
farsa é o mais cómodo de todos. E o mais estulto, também.
Tudo isto reforça a farsa. A grande
farsa que cobre, de norte e sul e do litoral ao mais recôndito interior, a
brava nação. Os compatriotas, ensinados a aceitar os lugares-comuns sem discussão
habilitada, são atores voluntários da farsa em que participam.
Sem comentários:
Enviar um comentário