St. Vincent, “I Prefer Your
Love”, in https://www.youtube.com/watch?v=uZSCGeoVrZQ
Não adiamos o tempo de que somos
tutores. No miradouro de onde recolhemos os sedimentos de tudo nas mãos ávidas,
falamos as palavras desejadas no propósito enternecedor. Nos dias compostos,
com as férteis árvores por testemunhas, percorremos as ruas sem darmos conta, à
conta da cumplicidade entretecida nos novelos que reservamos em segredo. Trazemos
nas mãos as candeias que desfazem as trevas noturnas. Por dentro dessas
candeias, a chama que emana dos poros, selando o amor maior que se ajuramenta
em carruagens inteiras, todavia pequenas para o albergar na íntegra. Não se
perde, contudo, no que for sobrante. Pois esse é um amor maior do que o mundo
que o vê medrar. Sobrepõe-se a ele, configura-se seu penhor. As cartas jogadas
no anteparo do sono, em poemas ditos com a voz precisa, são mantimento
suficiente para o uníssono crescente. Não ostentamos as condecorações que nos são
devidas. Não queremos. Mantemos sob reserva, pois os umbrais de onde se colhem estes
frutos são impossíveis de trazer ao exterior. Somos a mina sem fundo de onde
vertemos as águas férteis que vão aos solos infecundos com a fecundidade de que
somos tutores. Não há tempo furtivo que escape à tutela de que somos capazes. Deixamos
o tempo vir às mãos e já não o deixamos fugir. Fazemos com esse tempo o que
quisermos, sem autorizações, sem prestar contas – a não ser aos únicos penhores
dessas contas, que somos nós. Na singularidade do cais onde somos esteio, dando
abrigo aos mares todos que entrarem no porto, juntamos as ruínas do que houver
por ruína e devolvemos ao mundo com cores edificantes. Pois somos o caudal onde
os mares se alojam, os conhecidos e aqueles que vierem ao conhecimento pelas
descobertas de que somos pioneiros. E depois, montando em cavalos selvagens
suavemente domesticados, transgredimos a fúria dos elementos inquietantes e
arroteamos o chão aveludado que deixamos em espólio. Somos hélices dos navios
todos, até dos tresmalhados. Aos órfãos, trazemos as pétalas ungidas pelo sobressalto
contínuo que não nos deixa atravessados na desaventura da história. Damos-lhes
os mares todos por navegar, os mares que deixamos em legado depois de os
navegarmos. Por fim, trazemos à memória os jacarandás em seu explosivo desabrochar.
E sabemos que esses jacarandás são os nossos olhos.
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