Ty Segall, “Sleeper” (live
on KCWR), in https://www.youtube.com/watch?v=KFUb6tNU_Xc
Nas antepenúltimas eleições, o
candidato figurava no lugar trinta e seis na lista para a junta de freguesia. Fez
o seu caminho. Participou em todos os jantares do partido. Colou cartazes. Desmultiplicou-se
em comentários em fóruns e em redes sociais, sempre a favor da sua cor partidária
em acríticas intervenções onde fazia gala do pior seguidismo (a que ele, ufano,
chama “lealdade”). Marcou presença em cerimónias públicas, fazendo questão em
se colocar em pose estratégica atrás das câmaras da televisão quando um
ministro ia de visita à terra, como se fizesse parte da comitiva oficial.
Nas penúltimas eleições foi premiado
com lugar elegível para a junta de freguesia. Nunca mais deixou de usar fato e
gravata. Meteu um garfo pela goela abaixo e fez da circunspeção pose diária,
como se fosse o mais alto representante do Estado, a dar crédito à pose solene que
insistia em empunhar. Foi um trabalhador incansável. Continuou omnipresente em
tudo o que fosse pública cerimónia – na freguesia e, por se considerar
representante local, nas cerimónias municipais. Continuava a fazer o seu
caminho. Era um frenético avençado das suas inesgotáveis ambições.
Em vésperas das eleições que se
seguem, foi premiado com uma promoção na hierarquia das (possíveis) sinecuras. Faz
parte da lista de candidatos do partido à câmara municipal. Figura no lugar número
onze. O mais certo, é não ser eleito: nas eleições anteriores, o partido elegeu
cinco vereadores e, a correrem bem as contas para o partido (o presidente da câmara
é popular), é possível arrebatarem mais um vereador. À boca pequena, diz-se que
três dos candidatos em lugar elegível só estão na lista para fazerem número –
ou, que é o mesmo, para darem crédito à lista com os seus nomes carregados de reconhecimento
público. Se esses três candidatos não chegarem a ocupar os lugares na vereação,
sobem os três seguintes – os números sete, oito e nove.
O candidato continua longe do
estrelato da vereação. Dois lugares abaixo. E, todavia, já faz campanha,
ativamente, em antevéspera das vésperas do início da campanha eleitoral. Deixou
de aparecer na junta de freguesia. Faz quilómetros atrás de quilómetros pelas
estradas do concelho. Fala com as pessoas, dos mais idosos às criancinhas que
querem é estar na algazarra no recreio. Vai às catacumbas da memória,
resgatando dos tempos em que era vendedor ambulante a verve própria de quem foi
treinado para vender gato por lebre. Depois do presidente do município, é o
rosto que mais aparece, a personagem mais frenética. Faz garbo do estatuto: ao
mesmo tempo que se desfaz em simpatias gelatinosas, exige tratamento de excelência
(salta filas no supermercado, nos cafés, nos restaurantes; manda as contas para
os paços do concelho, vivendo à grande; faz-se convidado em cerimónias nas
escolas, nos bombeiros, nos clubes do município, em eventos culturais – de que depressa
se despede, com o pretexto de outras inaugurações a esconder a falta de
sensibilidade para a cultura).
Os poucos que não suportam a sua prosápia
comentam, em tom jocoso, que o candidato ainda não terá dado conta que só é o décimo-primeiro
da lista. Talvez esteja a preparar caminho para as eleições daqui a quatro
anos. À quarta será de vez e um lugar na vereação virá ao seu bornal. Pelo sim,
pelo não, já correspondeu ao pedido do edil e satisfaz as necessidades da
primeira dama (à falta de competência do edil para o assunto).
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