3.12.20

Don’t play with me a game that you will win (2.0)

Beirut, “When I Die”, in https://www.youtube.com/watch?v=tAbGfxGBmlQ

Na base do pedestal: lançam-se os dados e tu sabes que sairás vencedora. Pela minha parte, sei que estou fadado à derrota. Jogamos os dados. Confirma-se o oráculo que se deitou sobre o pretérito. A maré volta ao seu destino.

Podia comiserar-me, talvez puxar lustro ao meu melhor fraseado e suplicar que não jogasses comigo um jogo que sabíamos só poder ter-te como ganhadora. Mas se o fizesse, não extraímos deleite do jogo, e ambos sabemos que vamos a jogo pela vã sinecura dos prazeres que se fundem num nada. Isto na tua maneira de ver, pois eu, incorrigível perdedor, nunca soube do sabor de uma vitória ao jogo.

Em vez da pose compungida de que se quer sujeito de um apiedar alheio, deitei os dados sobre o chão avulso. Lancei os dedos, enquanto deixava o pensamento marear nos corredores interiores, enunciando sucessivamente, como se fosse uma prece, “don´t play with me a game that you will win.” Em silêncio me mantinha, reprimindo a voz que queria ser o dínamo da vontade interior, condenada a manter-se interior. Os teus olhos irradiavam uma alegria contagiante. Como podia sequer murmurar que não jogasses comigo a este jogo que ambos sabíamos ser teu triunfo ainda antes de o termos começado?

E jogávamos, uma e outra vez, sempre como o mesmo resultado. Nenhum de nós extinguia as forças na perpetuação do resultado. Um dia perguntaste se eu não queria ganhar o jogo. Fiquei impassível. O interrogado abria as feridas da ilogicidade. O jogo fora inventado para só tu o ganhares. Só tu o podias ganhar. A insinuação de que me deixavas ganhar era como se perdesse o jogo, e logo à partida. Farias de propósito, como se te anulasses temporariamente, só para eu levar à boca uma colherada de glória. Recusei. Preferi continuar a jogar o jogo sabendo à partida que não o ia ganhar.

Pelo tempo fora, aquela interrogação, que soara a proposta, assaltava-me. Havia um jogo de espelhos. Tu insinuavas o que eu mantinha no pensamento restrito que emudecia a voz. Ao menos, conseguiste quebrar o gelo do silêncio. Arrebataste as palavras metidas em camisas-de-forças, e não era pela loucura ter tido o seu bel-prazer. 

O jogo era a metáfora que tingia a pele com as sucessivas camadas de atonia. Um remédio para uma maleita sem paradeiro. Ou nós os dois a fazermos de conta que éramos nós os dois.

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