A madeira tem propriedades heurísticas. Por exemplo: se percutida três vezes com os nós dos dedos da mão direita, o agente fica protegido contra os azares em toda as suas transfigurações (o azar em sentido literal, o mau olhado, a mofina, o pé frio, etc.). Alguns homeopatas das almas certificarão a madeira, que atua como um blindado que precata as aleivosias que atentem contra a sorte. Ainda está por saber (a ciência esotérica não avançou tanto) se os veios que preenchem os toros de madeira são uma quimera contra o mau olhado, ou se a mofina fica desarmada com o leve percutir dos nós dos dedos por ser muito sensível a ruídos. (Hipótese em que ter-se-ia de questionar porque outros sons, bolçando mais decibéis, não produzem um efeito regenerativo contra os infortúnios.) Os homeopatas das almas ainda não esclareceram se todo o pau serve para a obra de esconjurar o azar, ou se são certos tipos de madeira que possuem certificação. Ou ainda: quando incêndios estivais devastam florestas inteiras, se o mero percutir dos dedos dos guardas-florestais não seria suficiente para travar o lume assassino de árvores. Os incêndios florestais são a demonstração que a homeopatia das almas que garante o sortilégio da madeira percutida três vezes é um logro. Como parece atestar os muitos fiascos de que foram vítimas filhos diletos das superstições, quando fica comprovado que a superstição não passou de isso mesmo, sem efeitos visíveis no que se pretendia salvaguardado através da ativação da superstição. As pessoas já deviam ter aprendido que o simbolismo das superstições se esgota num poço vazio de onde não se retiram os efeitos pretendidos pelos divulgadores de superstições. Os que creem nas superstições são o público aval das suas interiores fragilidades.
27.8.21
Baterás três vezes na madeira para esconjurar o azar (e outras superstições) (short stories #360)
Chemical Brothers, “Midnight Madness”, in https://www.youtube.com/watch?v=cHtoBqmRYfA
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