Os corpos repousam. Tomam a ténue luz em seu regaço para que sejam, outra vez, imperadores do tempo. São ousados na gramática que entretecem. Não são como o desejo puído que se torna indigente no sopé da letargia.
A pele sentida encosta-se à pele sentida. Os suores misturam-se numa combustão de olhares embebidos. A pele tatua-se com a pele outra, as duas transformadas numa filigrana única. Os dedos desenham a cartografia do corpo. Seguem as suas linhas como se fossem um montanhista a fugir do absoluto enfado do mundo. Vão buscar a água funda que desmata o estio traduzido em consumição. Apuram outra forma de linguagem.
A cabeça que vem ao regaço inspira-se no tumulto de ideias. As palavras ditas são estrofes que se levantam na madurez do tempo, para o fazer o mais neófito fragmento da vida que espera. A vida é isto. Uma dança sem regras. Os olhares que se combinam no silêncio como se fossem poemas altivos, poemas que respiram pelos corpos deles dependentes. Quando apetece, começamos as frases por minúsculas – e isso não faz das frases pequenos excertos ditos na gare de onde nos transformamos em tutores das marés que se avivam nas esculturas demoradamente cinzeladas pelas nossas mãos.
Sem sabermos, tornamo-nos penhores únicos do livro que não se desgasta, o livro onde depomos o entardecer em violinos cantantes. A matéria válida que se agiganta do magma entrelaça-se nos corpos. Derramada, dir-se-ia obra irrepetível, a prova viva da consagração dos corpos em sua quimera.
Resistimos ao desgaste do tempo; aprendemos a namorar com ele, por sabermos que na sua ausência o vazio se apodera de nós e não seremos se não uma remota semelhança de tanta grandeza. Os sentidos estão de atalaia. Despertam do torpor em que se investem na hibernação ocasional. Durante a hibernação, sonham; sonham como se voassem à altitude de um avião comercial, com a candeia presa na mão a mendigar a claridade que se levanta, desapossando-se dos vultos inertes que queriam ser sua mandante.
E nós, suseranos dessa candeia, desenhamos os nossos corpos por dentro do corpo outro que se entrega no cais sem paradeiro. Só nós sabemos do seu paradeiro. Com a ajuda da candeia, que se não gasta.
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