Perguntaram se acreditava na guerra (o rastilho está aceso e a Rússia quer invadir a Ucrânia). Respondi que não acredito na guerra. Desconversei, empurrando a pergunta para fora do seu contexto, distorcendo-a a pretexto do entendimento que quis dar à pergunta: quem acredita que a guerra é uma solução? Foi assim que me conveio tresler a interrogação.
São demenciais os arquitetos das guerras, soldados de variadas patentes que se colocam a soldo de políticos megalómanos ou que, eles próprios, tomam as rédeas do poder e põem boca nas armas, deixando-as a falar o idioma sangrento das vidas que se apagam. Há dias, num golpe de Estado na Guiné-Bissau, que ainda está por apurar se foi golpe ou golpada; e agora, com a fervura na Ucrânia que contrasta com as imagens do Inverno rigoroso, as belas paisagens cobertas do branco da neve violentadas pelas lagartas sujas dos tanques na sua marcha a caminho da violência. São demenciais e ignaros: desprezam as lições da História, que ensinam aos tributários de pelejas armadas que os últimos exemplos de guerra na Europa mostram que aqueles que as iniciaram sempre as perderam.
Quem acredita na guerra? A pergunta devia ser diferente: quem acredita que a guerra está à distância de uma mão cheia de loucura? Por estes ou por outros termos, essa era a interrogação certa. Volto à interrogação na sua formulação original: quem acredita na guerra? Serão os que têm certidão de óbito aprazada para o tempo que a guerra durar? Será tanto o despojamento da sua individualidade que se oferecem, mártires instantâneos para serem o instrumento da gula demencial dos mandantes. Os mandantes não devem dormir descansados. Há instâncias que os podem convocar a responder por crimes contra a humanidade. Mas nem assim se demovem, os políticos que parecem viver no limiar do ensandecimento, incapazes de perceber que uma vida humana devia valer mais do que todas as guerras juntas, por mais justas que as invoquem os seus defensores.
Os militares de variegadas patentes deviam ser submetidos a um curso intensivo de História e outro de Filosofia. Intensivo, mas de nível elementar (tanto bastava). E deviam voltar às casernas, bebericando boçalmente as cervejas ou a vodca que os mantêm ocupados enquanto se entretêm com passatempos vários, entre as guerrinhas de brincar em cenários diligentemente montados e exercícios faz-de-conta só para desenferrujar a artilharia e dar combustão à adrenalina. Sem terem de matar inocentes. Sem irem dormir com esse peso a arquear-se sobre a consciência (a dar-se como provada a sua existência).
Aos militares de variegadas patentes, dir-se-ia: (ao) lugar, tenente. E o lugar são as amuralhadas casernas, de onde não deviam sair sob pretexto algum. O resto da espécie agradecia o contributo para a paz.
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