3.2.22

Em câmara lenta, como um ator de cinema (short stories #374)

Oláfur Arnalds, “Near Light”, in https://www.youtube.com/watch?v=0kYc55bXJFI

          Escolhia o peso válido para compensar o tempo. Era do fervor da pele, mas parecia que o tempo se apressava na escola em que se compunha o horizonte, e os olhos fingiam não saberem do paradeiro dos socalcos. Pois era nos socalcos que se refugiava a aragem perfumada com o seu quê de quimera. Se voltasse a página atrás os modos saberiam não ser um fingimento espúrio. E o que interessava? Diziam-lhe que era de pouca lucidez insistir no critério que fintava a destemperança do tempo como ele era dado a conhecer. Nessas alturas refugiava-se em várias personalidades construídas em segredo: ao menos, elas não coabitavam na improfícua tirania do tempo e ninguém sabia do seu paradeiro. Era como se fosse um ator de cinema e as imagens caíssem amparadas por uma câmara lenta. Dizia, em sua defesa: é nesse vagar que se podem captar os milimétricos objetos do desejo que escapam nas intermitências do tempo que nos desarma. Se ao menos houvesse uma porta mágica que abrisse com a voz de comando da vontade e, atravessada a porta, a paisagem já não fosse a melancólica raiz de uma árvore à espera do funeral. Sim, seria ator desfilando languidamente no espaço limítrofe, à procura dos deslimites por onde pudesse ser algo mais do que era. Oxalá pudesse reinventar a velocidade do tempo, torná-lo vagaroso – torná-lo pretexto para consagrar um santuário às muitas vidas que podiam ter sido colhidas por dentro da sua pele. A carne avivada era o fermento de uma lava que se arrumava meticulosamente na paisagem (dir-se-ia) desenhada. E as cordas do violino falando por mim, tolhido pela mudez das estrofes que teriam sido oportunas. Porque, ainda ator, sabia ler de cor o silêncio na pauta demorada atravessada pelo tempo conspícuo. 

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