Não se insista nos mesmos hábitos que transformam o quotidiano numa rotina, nos mesmos preconceitos, nos mesmos adornos retóricos (transfigurados em lugares-comuns), nos mesmos pressentimentos que nunca se confirmam, nos mesmos lugares quando há tantos desconhecidos por demandar, nas mesmas pertenças, nos mesmos repositórios de costumes, nas mesmas teimas que não se cansam, nos mesmos vieses armadilhados em fortes teias, nos mesmos julgamentos autocontemplativos que depois se caldeiam com uma angústia inexplicável, nas mesmas superstições, nas mesmas imagens de deuses só por interior conforto, na mesma sofreguidão entre narcisismo e auto depreciação, nas mesmas geografias hiperbolizadas, nas mesmas cidades sem curadores, nas mesmas fortalezas tão frágeis, nas mesmas águas furtivas que não encontram um caudal a preceito, na mesma impaciência, nos mesmos medos não esconjurados, nos mesmos luares que se ateiam no sentimento baço, nas mesmas redes do passado que ultrapassam o futuro antes de o ser, nas mesmas atalaias que se estendem sobre os outros, nos mesmos espelhos que não perdem validade, nos mesmos prantos interiores que se reconciliam na solidão, na mesma impureza que atira meneios de indulgência como pretexto para exculpações, nas mesmas góticas palavras que se entretecem num gongórico falar (antes houvesse profundo silêncio), nos mesmos arsenais que só se armadilham contra incertos, nos mesmos povoados rurais que se enredam num xisto umbroso, nas mesmas rodas e nas mesmas estradas sem arrematar algum conhecimento de causa, nas mesmas metáforas exauridas, no mesmo cansaço que esgota a noção de cansaço, na mesma intolerância que desmente teóricos pronunciamentos, no mesmo policiar do totalitarismo dos outros sem reparar que se averba o seu privativo, não reconhecido, totalitarismo, no mesmo igualar dos dias pretéritos, deles fazendo uma câmara escura que se repete sem deixar que haja diferença entre os dias sucessivos, na mesma franquia devoluta, no mesmo despreparo contínuo. No mesmo mesmo, a meio do nada.
26.1.23
Cromos repetidos (short stories #416)
The Stranglers, “Golden Brown” (live), in https://www.youtube.com/watch?v=-W4LvJ2tdvk
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