Está um frio que pede agasalho. Pela rua fora, adolescentes passeiam os seus umbigos descobertos. Elas desfilam com dois palmos de pele abdominal sem agasalho, desafiando a meteorologia e causando arrepios aos outros, que através dos arrepios são procuradores em nome das desmioladas adolescentes sem frio.
Em vez de se questionar se as adolescentes não têm frio quando o termómetro estacionou logo acima da fronteira entre os graus positivos e os graus negativos, a pergunta deve ser outra: o que leva as adolescentes térmicas a mostrarem as suas rasas barrigas? Sendo uma idade em que a estética conta muito, as adolescentes movem-se pela antinomia. Olham para as mães e para os pais e acham-nos obesos, com protuberantes barrigas que são um insulto aos cânones da estética. Não querem ser assim. E como o conseguem, exibem orgulhosamente o que os progenitores deixaram de ser, por desleixo (ou apenas porque a biologia conspira contra eles).
As adolescentes não são imunes ao frio invernal. São mais sensíveis à estética que sabem não ser respeitada quando os progenitores (e outros da sua geração) provam, em corpo próprio, que se desmazelaram no cuidado dos seus corpos, exibindo atrozes barrigas que deformam as silhuetas. Regem-se pelo princípio da autoexclusão. Querem mostrar o que os pais e as mães têm vergonha de mostrar. Nem que tenham de rapar um frio glaciar.
As barrigas adolescentes propositadamente ostentadas durante o Inverno exercem um efeito terapêutico: as meninas, de tanto frio apanharem, e de tantas constipações terem sido assim causadas, constituem uma bolsa de anticorpos. Podem andar sossegadamente a meio de um nevão com os umbigos à mostra, que já ganharam resistência para não serem hospedeiras dos vírus maus do Inverno.
Ou então, tudo não passa de uma questão de umbigos à mostra (metáfora do umbigo como representação do ensimesmar). As adolescentes que desafiam a invernia com as suas lisas barrigas à mostra apenas ostentam lisas barrigas que, por o serem, satisfazem as balizas da estética. Pode não ser um reflexo condicionado que dá corpo ao princípio da autoexclusão. Não estão preocupadas em estarem a cento e oitenta graus a leste da fealdade não disfarçada das avantajadas barrigas das mães e dos pais. A sua beleza – a estética, outra vez – não é feita da inestética dos outros.
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