7.8.23

A tradução da euforia

Sault, “Glory”, in https://www.youtube.com/watch?v=UNrlZiXjVGc

Um périplo pela ausência. Talvez, um dicionário de multidões, sem haver conhecimento de uma única alma. Os objetos transitam entre os dias ajuizados, oferecem-se aos leigos. Atingia um estado de invasão para o exterior: um narcisismo virado do avesso, às fundações resgatada uma euforia com paradeiro.

Era preciso era um dicionário da euforia. Para aferir se a euforia não era excedentária. Se esses forem os preparos da euforia, adivinha-se um amplo precipício. Os escultores da prudência aconselhavam – isso mesmo – prudência (ou dela não fossem exímios artesãos). A euforia devia ser limitada para que não fosse desmontada. Se em vez de deceção soasse o zimbório do legitimamente possível, o precipício mudaria de lugar: seria um pequeno precipício, a sua queda controlada e não dolorosa.

Mas a euforia parecia não desafinar. Em volta, tudo parecia surpreendentemente belo (não estava habituado: o olhar limítrofe costumava esbarrar nas inestéticas aparas deixadas pelos que bolçavam). Quando levantava o véu do porvir, pedindo a licença dos oráculos atentos, o pressentimento não se gorava: nunca fizera tanto sentido prefaciar o adágio segundo o qual dias melhores estão prometidos nos ditos oráculos.

A minimização das desilusões convocava o temperar da euforia. Não seria ilegítimo temperar o avanço do futuro. Em vez de uma ambição sem medida, o rogo da modéstia (sem ser de falsa jaez). Desde o grande observatório do mundo, alguns observadores preferiam limitar as esperanças. Podia um contratempo destruir as bases do pensamento, adulterando os pressentimentos hasteados. A moderação constituía uma prevenção à prova de possíveis dissabores. Nunca se dê por garantido um pressentimento, que o futuro, tornado presente, pode desmenti-lo. 

Temperar a euforia era uma carta a favor da euforia. Se as marés não estivessem a favor, a euforia seria injustificada. Ilegítima e contraditória. Com a agravante de ter fermentado férteis vulcões de euforia que não teriam tradução, deixados desertos pelo dicionário da euforia. Devia haver peritos em euforia. Para serem os seus tradutores, não deixando os eufóricos à mercê da euforia mendaz.

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