25.8.23

Fotografias vegan (short stories #442)

Man Without Hats, “The Safety Dance”, in https://www.youtube.com/watch?v=1p_BvaHsgGg

         Estava impressionado com a diferença entre o rosto ao vivo e o rosto que ocupava praças da cidade. O primeiro tinha rugas. O segundo, não. Se a intenção era convencer os cidadãos, como podia a personagem capitalizar simpatia ao colo de uma mentira do seu rosto? Só se fosse uma intrujice intermediada pela vulgata do “o que interessa não é o rosto, é a alma” para afocinhar os cidadãos na projetada indigência. Só um esteta da arrogância pode emitir um certificado que insulta a inteligência dos cidadãos, reduzindo-os a um estatuto de modesta inteligência. Por outro lado, somos instruídos a ter medo do envelhecimento. Os figurões que posam para os programas que costuram a imagem sabem-no. Aproveitam-se da sanha que caiu sobre a velhice: aos velhos reserva-se um lugar na reforma, é vez de eles darem lugar aos menos velhos e aos mais novos. Mas não passam de máscaras. As máscaras só são voluntárias no carnaval. Fora da época, são disfarces. Quem precisa de disfarce é que não confia em si se sua for uma imagem de autenticidade que esbarra na aprovação dos modernos arquitetos de imagens públicas. Nos cartazes, mostram quem não são. São a prova da contrafação certificada. Quem se habitua a vê-los afixados em cartazes invasores, o rosto de um tamanho que faz de todos nós meros habitantes de uma lilupitilândia, não esconde o alvoroço quando é testemunha presencial desses rostos. A quimera da fotografia curada é desmentida pela observação. A pessoa não parece a que aparece retratada. Não é uma credencial que seja repositório de orgulho. Quem vê caras gastas que se escondem na miragem de uma fotografia irrepreensível, debita o descrédito a favor da personalidade. São fotografias vegan, impecavelmente depuradas, como se os laivos de envelhecimento fossem um defeito. São os que menos merecem confiança.

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