Nunca perguntaram aos porcos ibéricos se querem continuar a ser espanhóis e portugueses. E, contudo, os porcos ibéricos, sendo ibéricos por genealogia, devem ser os primeiros interessados em que Portugal e Espanha deixem de ser países soberanos, fundindo-se num só. De outro modo, ibérica não seria a sua linhagem.
Os apóstolos da soberania (de cada lado da fronteira) encontrarão rudimentos de uma conspiração que hostiliza a História de cada país. A meio do protesto, vociferam contra os Barrabás que abjuram a independência. Do lado castelhano, as vozes zurzem contra os catalães, os bascos, os galegos e até alguns andaluzes que sonham com a sedição que os leve à independência. Do lado lusitano, vozes atentas insurgem-se contra os imperialistas castelhanos que aspiram à correspondência entre a geografia da península ibérica (mais arquipélagos adjacentes) e um país só. Os apóstolos da conspiração não falam a uma só voz. Os que se amedrontam com a hipótese de uma Ibéria alimentada desde Castela divergem da conspiração que amedronta os advogados de defesa de uma hispanidade que se mobiliza contra as regiões autónomas.
Alheios a tudo isto, os porcos ibéricos ostentam passaporte da Ibéria (ou não fosse ibérica a sua árvore genealógica). Pastem nas planícies alentejanas ou nos pastos andaluzes, não se consideram portugueses nem espanhóis. São ibéricos. Podia ser apenas para serem indulgentes com os ignaros americanos que consideram, em maioria estatisticamente comprovável, que a geografia da península ibérica coincide com um país único com capital em Madrid.
Falta saber se o porco ibérico é sedentário ou se, respondendo a um impulso nómada, se espalhou pela geografia da península ibérica. E falta saber se os porcos ibéricos se miscigenaram com porcos de outras genealogias, contagiando-os com o sangue ibérico. Talvez já não haja porcos autóctones e eles sejam quase todos ibéricos. Só para fazer o favor aos sonhos dos iberistas de serviço. Como se a espécie fosse uma praga.
Podia-se pensar em nomear o porco ibérico como embaixador da causa iberista. Possa não ser boa a ideia, para que os aguerridos soberanistas, de um lado e do outro da fronteira, não caiam num devaneio de genocídio, liquidando, um atrás do outro, os exemplares conhecidos da genealogia ibérica. Nem era do interesse de lojas de presuntos e de outro fumeiro à base de porco. Quando a produção supera os desejos dos consumidores, os preços naufragam. A Ibéria – com a vossa licença – perderia um porta-estandarte.
Os mercados (que são malditos para os iberistas) detestam a ideia de uma Ibéria, mas labuzam-se com o fumeiro do porco ibérico.
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