1.9.23

Ex-aequo

Black Country, New Road, “Snow Globes” (live), in https://www.youtube.com/watch?v=AUQY8x-QauQ

Era tanta a sede de fazer iguais que não escolhiam uma das alternativas a concurso. Não havia concurso. As alternativas não eram admitidas a concurso. Por mais que lhes explicassem que a escolha era imperativa, recusavam a incumbência. Defendiam-se com a reserva de consciência e ninguém os podia forçar a fazer uma escolha. Por mais que os tentassem convencer que uma das alternativas era melhor, desviavam-se do imperativo categórico com a válvula de escape do subjetivismo. Se esbracejassem com a objetividade, questionavam quem estatuiu os critérios objetivos. Se acenassem com as credenciais irrepreensíveis dos senadores, logo loteados num lugar à prova de contestação, diligenciavam interrogações que punham em causa conceitos como “irrepreensível”, “senador” e “à prova de contestação”.

Não queriam ser figurantes de um estojo de cosmética em que as escolhas estavam contaminadas à partida. Um melhor é o melhor porque correspondeu aos parâmetros estabelecidos. Importava saber quem os estabeleceu; se é aceitável a sua linhagem para abraçar tamanha incumbência; e se não há interesses escondidos na escolha ou, o que é pior, na determinação dos critérios que avalizam a escolha.

Iam mais longe: não podiam ser obrigados a fazer uma escolha. Podiam argumentar que escolher uma alternativa fazia parte do roteiro necessário; podiam aquiescer que sem esta ordem de alternativas a provisão do tempo e a escala do futuro se tornavam impossíveis; mas eles avocavam a liberdade de espírito que compreende a latitude de decisão sobre se escolher ou não entre as alternativas perfiladas.

Confiavam na intuição. A intuição declarava caça às seriações que ditam o obséquio de uma escolha. Insurgiam-se contra a opacidade das alternativas a concurso: de onde vieram, quem as formulou, que contextos as explicam, havia interesses disfarçados atrelados às alternativas a concurso? Preferiam a não escolha. A ausência de alternativas. Um vasto deserto, apenas à espera que fossem eles, em pose de arquiteto supremo, a ditar sentenças, a prover hipóteses, a jurar que nunca dariam caução a um primeiro lugar, a um segundo lugar e assim sucessivamente. Não escolhiam. E isso era uma escolha, que começava a fazer escola.

Os apóstolos do ex-aequo tornaram-se os piores déspotas.  

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