The Last Dinner Party, “Caeser on a TV Screen”, in https://www.youtube.com/watch?v=wqcYU_eoihU
As salas de estar são o lugar onde se conhecem desconhecidos. Rivalizam com a teoria das probabilidades: quem antecipa a estadia numa sala de estar não pode pressentir as pessoas que vão coincidir consigo. Pode ser uma pessoa emudecida – diriam: não há pior forma de conhecer um desconhecido, mas atendendo à mudez voluntária do sujeito, pode ser ele a dizer-nos, através da sua mudez, que o melhor é não o quereremos conhecer. Pode ser um palrador, que tem opinião sobre qualquer assunto – e a estadia numa sala de estar presta-se a uma lata mundividência de assuntos, pois as salas de estar têm televisões habitualmente sintonizadas em canais que passam um horrendo cortejo de notícias. A opinião fecunda é o alinhavo de um excesso de ignorância: o pior ignorante é aquele que de si tem um autorretrato de intelectual. Aprende-se alguma coisa com o ignorante encartado que, a cada palavra salivada, excreta um obscurantismo loquaz? Aprende-se a ter tento na língua e freio na opinião quando alguém se deita a adivinhar ou, o que é pior, a tresler as palavras que surgem em forma de ideias que, todavia, são incapazes de assimilar na sua apta interpretação. Aprende-se a ser o que não se deve ser. E se alguém, a meio da estadia na sala de estar, procura corrigir os dislates do catedrático apedeuta? Pode sair tolhido, que um ignorante não admite que a sua ignorância seja desflorada. Pode o paciente corretor dos dislates alheios tomar pose pedagógica, tentando provar, com as melhores e irrefutáveis provas, que o prevaricador da inteligência se expõe ao ridículo. O mais certo é o prevaricador retorquir com arrogância, disfarçando a incultura com uma soberba intimidatória. Numa sala de estar, a melhor conduta é a mudez e a discrição. O anonimato sempre fez bem. Sobretudo numa sala de estar.
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