Michael Kiwanuka, “One and Only”, in https://www.youtube.com/watch?v=seM1jQQ2Abs
Convocatória de greve geral das crianças, para um dia destes: sem pré-aviso, sairemos de casa sob protesto para os nossos pais saberem que vamos contrariados para a escola. Uma vez chegados à escola, recusar-nos-emos a comparecer nas aulas.
Fundamentação:
Não queremos continuar a de ser enganados pelo imaginário do Natal construído pelos mais velhos. Vamos a um centro comercial, ou a uma feira de Natal, e posamos com o Pai Natal. Chegamos à escola e mostramos as fotografias uns aos outros para descobrirmos que: ou o Pai Natal consegue o milagre de estar no mesmo sítio ao mesmo tempo; ou é um intrujão, fazendo-se passar por quem não é; ou, afinal, não existe. Podiam admitir, os gestores do Natal e os nossos pais, que não há o Pai Natal, que há, talvez, milhões de Pais Natal espalhados pelo mundo, mas que são personagens simbólicas. Podiam confessar-nos que não existe uma pessoa chamada Pai Natal.
Estamos cansados da infantilização que é um anátema, como se fizessem de conta que não somos de uma geração diferente, com acesso a telemóveis por sua vez com acesso ao mundo (existente, imaginário e o do Trump) que nos trazem a informação que os mais velhos, quando tinham a nossa idade, nem sonhavam ser possível existir. Estamos revoltados por os nossos pais e os nossos familiares chegados insistirem na mesma infantilização de que foram vítimas quando tinham a nossa idade. Queremos ser a última geração vítima desta infantilização. Juramos que não faremos dos nossos filhos e sobrinhos uma gesta infantilizada.
Não queremos continuar a pactuar com a mitologia do Natal que é uma pura falsificação. Não é preciso ser perspicaz para descobrir que as prendas de Natal não são distribuídas por um consórcio de Pais Natal locomovidos por remas, porque as renas não voam e ninguém nos revelou pormenores sobre o franchising do Pai Natal. Já não somos ingénuos para nos contarem a patranha das prendas que descem pela chaminé, porque no regime de propriedade horizontal, hoje dominante, a chaminé é por prédio e as prendas de Natal não são uma encomenda coletiva.
Como temos uma precoce, mas bem informada, consciência de classe, queremos denunciar o Natal pelos efeitos nocivos para a justiça social. Há muitas crianças que não podem sonhar com o Natal fantasioso que o capitalismo propaga para as domesticar desde a infância. Insistir na celebração fraudulenta da quadra arrasta muitas crianças para a melancolia por não terem acesso a um módico de generosidade natalícia a que as crianças favorecidas têm direito. Persistir no Natal assim encenado é perpetuar as desigualdades, castrando os sonhos que essas crianças não podem a experimentar.
Pelo exposto, faremos greve às aulas e à sopa por dois dias, em dia que nos apetecer, sem estarmos vinculados a um pré-aviso. (Como somos menores, a inimputabilidade perante a lei dispensa-nos das suas exigências.). Deixamos, à consideração de quem gere o Natal, a exigência que o Natal deixe de ser como é, para não continuarmos a ser infantilizados como somos.