In http://www.tvi24.iol.pt/multimedia/oratvi/multimedia/imagem/id/13973305/877x658
O ministro Machete pegou no machado e
tratou de descompor a serenidade das relações amorosas (partindo-se de um
monogâmico pressuposto). Acusado de ter mentido ao parlamento, não lhe ocorreu
melhor que retorquir que mentira não fora, fora uma simples “incorreção
factual”. Truques de semântica de quem tira um atestado de ignorância ao
cidadão comum. Suponho que Machete terá acreditado que a sua pose de quase
senador da política dispensa outras justificações mais convincentes e
racionalmente elaboradas. Terá pensado que a coisa ia lá com um eufemismo, ou
um malabarismo semântico típico dos advogados e, mais ainda, dos advogados que
fazem política, já que o povo é simplório e come à vontade gato por lebre.
O pior pode estar para vir: gente
pouco dada à monogamia, mas que não quer estragar o relacionamento a que está agrilhetado,
congeminando cenários de adultério. Começarão por calcular que o adultério pode
não ser revelação pública, com o que só será adultério na sua íntima
consciência (que tem o valor de uma moeda fraca). Se vierem a ser descobertos
nas suas carnais fraquezas, que invoquem os adúlteros a doutrina Machete: “querida(o), não foi adultério. Tratar aquilo
por adultério é uma incorreção factual. Nem precisas de me perdoar.” Será expressão
alternativa, e com o selo persuasivo de tão eminente quase senador da política,
ao mais habitual “querida(o), tem calma, isto
não é aquilo que parece.” Ao que a(o) consorte vai à vidinha, convencida(o)
que tudo não passou de uma “incorreção factual” e que o(a) adúltero afinal não
o foi. A doutrina Machete inaugura uma nova era poligâmica (e poliândrica),
pois ninguém poderá ser acusado de ter mentido. Não terá sido mentira, apenas uma
“incorreção factual”.
Os advogados, e os advogados que
habitam a política, julgam-se hábeis na manipulação retórica. Estimam que sabem
todos os truques da semântica. Acham-se acima dos demais, ainda convencidos que
uma licenciatura em direito é das tarefas mais quase impossíveis que se conhece.
Têm uma destreza ímpar na insolência com que usam palavras querendo-nos
convencer que elas significam o seu contrário. É uma destreza que os candidata
a serem exímios atores. Depois entram nos labirintos da hermenêutica, numa
discussão que derrota os oponentes por KO de cansaço.
A doutrina Machete, a levar
vencimento, abeira-nos da promiscuidade. Quem diria que o seu ideólogo vem das
catacumbas do conservadorismo.
Sem comentários:
Enviar um comentário