In http://fc04.deviantart.net/fs40/f/2009/007/8/f/Take_my_hand____by_Qebhet.jpg
Era quando o enxoval das desgraças
esmagava a temperança. Quando as noites pareciam intermináveis, como se a noite
se unisse, em ligação direta, a outra, sem luz diurna visível. Quando os ossos
doíam das tempestades interiores que descompunham o corpo por dentro. Quando a
luz era baça, as cores oprimidas e a voz rasgava os sobressaltos que as voltas
aleatórias do tempo arrotearam. No fio da navalha. Com o punhal ereto em
ameaçadora pose, querendo ir à carne para a sangrar.
Mas depois, uma figura salvífica.
Depois, aos bocados, os azimutes todos repostos em seu lugar. Depois, das
ruínas de outrora nem sombra de cinza espalhada no chão. Depois – depois – já
nada parecia desabar em sobrepostas camadas de desjeito. E depois, quando veio
uma aurora diferente, com a claridade matinal a esbracejar poemas no céu tão
claro, os poemas tão altivos, havia uma mão estendida. Um salva-vidas
prontificando-se a sê-lo. A escuridão atilada perdendo os mastins furiosos que
partiram em perseguição, rosnando a sua fúria perante uma desajeitada forma de
ser. No labirinto que era perdição do corpo, imerso em desorientação dilacerante,
achou-se uma claridade que pressagiava uma porta. Do outro lado, com uma
generosidade desarmante, a mão estendida.
A mão estendida que se oferecia,
salvífica. Contraforte das fragilidades arquivadas num canto da memória (sem
serventia). Uma mão quente, suavemente adocicada, que vinha em afago quando
pesadelos tacanhos amedrontavam o sono. Ali estava a mão, sempre pronta, a temperar
os ânimos desassossegados. A tão generosa mão arrumou os embaraços no volteio
dos pretéritos a que não cabe reminiscência. E apeteceu dizer “tomo a tua mão”, enquanto as duas,
diferentes mãos, erguiam um cálice aos céus que eram testemunhas daquele
festim.
A mão nunca se esconde. Não se
intimida com o frio invernal nem com a canícula do verão. Não dorme. Vigilante,
num voo perene, cauciona a serenidade impante que veio depor o outrora
desacerto centrípeto. Quando ouvi “toma a
minha mão”, em humilde deposição que era afinal minha restauração das
ruínas, fui maior que o maior dos homens.
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