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Uma sociedade secreta. Sem fins
inconfessáveis. Nada colateral a espionagem. Apenas um clube escondido pelo
segredo, as portas subterrâneas derivando da curiosidade normal. Composta por
um pequeno grupo que perfilhava os mesmos ideais, a mesma cosmovisão. Sem
rituais pueris, aventais ou coisas do género, nem religiosidades que depusessem
a sua integridade. Reuniam-se quando calhava. Era só um deles puxar o gatilho
da reunião, em linguagem cifrada – não que temessem que os serviços de espionagem
estivessem de olho neles, que eram uma sociedade secreta e, todavia,
inofensiva. A linguagem cifrada era o sinal de um encantamento, ele talvez
pueril, pelo segredo. Não queriam que a sociedade deixasse de ser um segredo
bem escondido. Não queriam. Apenas.
Eram só meia dúzia. Diziam que a
pertença à sociedade era a melhor cura contra a velhice. Dava a ideia que a
idade era um estreito manto a que os seus corpos se conseguiam furtar.
Cultivavam o passado, sem vergonha de que o passado pudesse travar o passo às
novidades que vinham no trânsito do tempo presente. Até porque sabiam que só
fazia sentido entoar saudades do tempo que ainda estava por vir.
Um certo dia, um dos confrades pronunciou-se
por o que nunca tinha sido tema: podia a sociedade abrir-se a sangue novo? Um
deles questionou se o sangue novo significava novas pertenças. Se deixariam de
ser meia dúzia. Era tabu sem nunca o ter sido. Era como se um implícito código
de conduta pusesse pesada sepultura no assunto. De tal modo que nunca fora
falado. Até àquele dia. Os restantes cinco não fingiram incómodo. Um deles,
mais célere na reação, interrogou por que haveriam de mudar se até então a sociedade
fora tão perfeita no funcionamento. Correriam, talvez, o risco de desintegração
se o novo membro (ou os novos membros, que a proposta ainda não tivera sido
retalhada) não entendesse o código de honra e não soubesse ler nas entrelinhas
dos olhares, como eles estavam habituados.
Quem atirou o assunto para cima da
mesa indagou se eles eram tão conservadores. A confusão veio à boca de cena.
Quase todos os outros recusavam a companhia do conservadorismo, fosse de que
estirpe fosse. Naquela noite, a reunião acompanhou as horas que faziam
companhia à noite. Leais aos princípios da carta de intenções que tinham
assinado há trinta anos, decidiram nada decidir naquele fim de noite. Sabiam
que só a vontade de todos podia aceitar o assunto na reunião que viesse a
seguir. A ser aceite o assunto, o novo membro (ou os novos membros, depois se
veria) só podia entrar na sociedade se todos o aceitassem.
Cinco meses depois, ao cabo de um
silêncio sepulcral de quase todos, como se fossem contumazes do assunto, marcaram
a reunião. O assunto não o chegou a ser. Aquela era uma sociedade fechada.
Extinguir-se-ia assim que dos fundadores sobrasse apenas um sobrevivente. Os
outros cinco decidiram, com aquiescência de quem propusera a mudança, lavrar em
ata que a sociedade repudiava o catecismo conservador (significasse o que isso
pudesse significar).
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