Radiohead, “Reckoner”
(live), in https://www.youtube.com/watch?v=kPWvpDm076o
- Não digas que
sabes contar as estrelas que habitam no céu.
- Se me pedires...
- Como te posso
crer? Se os cientistas falam de um infinito de estrelas.
- Ou os cientistas estão errados (ele não há por aí
tanta ciência desacreditada?), ou sou capaz do impossível porque mereces que vá
à procura dos impossíveis.
- Não me
interessam metáforas.
- Nem a metafísica?
- Também não.
- O que, pois, te interessa?
- Um atestado de
probidade nas tuas palavras. Só assim poderei dormir sossegado.
- Em matéria de confiança, vejo-te com um alto grau de
exigência.
- Não estou em
condições de arriscar.
- Estes laços não se cimentam na confiança?
- Exatamente. Por
isso é que tenho de saber o que podes prometer.
- Falsa premissa. Começas por levantar o telhado da
casa. Se reparares, no fim da empreitada não tens nada.
- Insinuas que o
capital de confiança com que calço estes laços é um mau azimute?
- Não; apenas te digo que não podes selar a confiança
dos outros se partires com o propósito de a testar. É meio caminho andado para
os outros desconfiarem da tua desconfiança.
- Pelo que entendo
das tuas palavras, é um problema sem solução.
- Não chega a ser um problema. Ou, melhor: quando os
esteios estão hipotecados, apodrecidos, desaparece a confiança. Desparece tudo.
Até lá, mais vale confiar que os outros são de confiar.
- Admito que isto
me rouba horas de sono.
- Estás errado. Os estados da alma merecem a indulgência
de uma cama de jardim que baloiça pendida entre duas árvores. Merecem a
prodigiosa paisagem que se destapa de um olhar descomprometido.
- Não ficas
ansioso com a possibilidade de eu meter um punhal fundo na confiança de que te
julgas credor?
- Não. Confio em ti. No pressuposto que nada do que
temos por nós e à nossa volta é eterno.
- Nem que me
pedisses para jurar sobre algo de transcendente como prova de vida de uma
determinada verdade?
- Preferia que dissesses, como credencial, que é por uma
trovoada que te esclarece.
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