18.1.18

Altímetro

Sigur Rós, “Ára Bátur” (live at Abbey Road Studios), in https://www.youtube.com/watch?v=8VvB_UmmIzk    

Não vejo hora deste fogo se consumir, intenso e inebriado. Não vejo hora de largar âncora no santuário que é a combustão de um desejo. Não interessam as regras. Não se acostumam pesares quando apenas conta o sufrágio da febril intenção terçada. Não vejo hora de mergulhar na mortalha ainda vestida, temporariamente vestida, e congeminar os gestos desenfreados que esbulham a mortalha. Para, na infinita nudez, desenhar com os dedos os arrepios lânguidos de onde se recolhe a sede da loucura. Pele abraseada junto da pele outra, também abraseada, tecido único que desarmadilha algemas. Pelo meu altímetro, não andaremos longe do miradouro de onde se aprecia, com a distância exigível e a precaução do isolamento, o que do resto merece apreciar. Deitamos para trás das costas os meneios de um mundo que não interessa. Resumimos, se assim se puder dizer, o mundo que interessa ao que somos por dentro da nossa imensa inteireza. Os muros alteados são gesta não nossa. E nem eles constituem obstáculos: trepamos pelas paredes íngremes à medida da nossa sofreguidão, sabendo que na sua cúpula asseguramos a devolução do eu que andava escondido. Pela voz do meu altímetro, há mais água por encontrar na curvatura do teu corpo. E os dedos trémulos continuam a desenhar as palavras destemidas com a ajuda do suor arrefecido. A saliva insaciável desbota as ameias, que deixam de ser inacessíveis. Não vejo hora de hastear a bandeira desarrumada entre o restolho da manhã. Não vejo hora de ser a hora que abona a tutela dos corpos em sua espontânea consagração. O murmúrio ao ouvido é comando íntegro. Devolve-se um par de frases que atiçam a exaltação. Sabemos do paradeiro do frémito que é o epílogo sentenciador. Pelo meu altímetro, extinguem-se os minutos que faltam na mediação da implacável combustão. Pela voz interior que sentimos em cada poro, nos corpos uníssonos que se falam, um vórtice em tumulto emerge das profundezas. Um vulcão imperecível. E a lava a preceito. Não vejo hora de sabermos renovada a sede deste desejo. Não vejo hora de sermos mar outra vez.

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