8.1.18

Tardio?

Morphine, “Early to Bed”, in https://www.youtube.com/watch?v=4zw1Bli1jbc    
Não será a destempo o desvelo do tempo. Que não se diga que é tardio. Fora de horas vêm os rostos capitulados que firmam os pés no silêncio de uma escada rolante, fazendo-a substituta dos seus passos.
Dir-se-á que há um tempo próprio para tudo. Dir-se-á, a condizer, que tudo o que vier em contravenção desse tempo cinzelado não tem cabimento no calendário. Discorde-se, com impetuosidade. Nada é tardio antes do tempo. Mesmo que se seja tomado pelo convencimento (ou pelos cânones) que um desiderato ultrapassou o pessoal prazo de validade. Não são as rugas que comandam a vontade; é a vontade que se sobrepõe às rugas – e que se sobrepõe a todas as fronteiras congeminadas pelas matemáticas certezas que desensinam a vontade.
Parece que impera uma pedagogia cáustica que ensina as pessoas a sopesarem-se pela bitola do tempo que se arqueia sobre os seus dorsos. Ato contínuo, uma grelha de análise, rudimentar, mas grelha de análise, determina o que vem a destempo e os limites do aceitável. Combata-se essa grelha de análise e a indiferença que a contamina: as pessoas são diferentes, não podem ser agrilhoadas ao totalitário ditame que as junta em estratificações objetivadas. Por isso, nada é tardio antes de ser tentado. Tardios são os arrebatados pela inércia que se conformam com a sua anulação, ao recusarem um desafio que os cânones mandam dizer ser inoportuno. Pois esta é uma capitulação nefasta, uma encomenda que procrastina a pessoa e a deixa nos malquistos braços da senescência, mesmo na antecâmara do decesso.
Que o pensamento se mova com destreza entre os compadrios da inércia, que não se deixe sitiar pelo olhar melancólico que se derrota no tempo imediatamente vindouro e se deita nos deleites vacantes do pretérito. O melhor favor que se podem fazer é olvidar o tempo pretérito, despachando as memórias para o cais onde são liquidadas. São as algemas do passado que as demovem do que estiver por fazer, logo ditando a madraça impossibilidade do feito. Na maior parte dos casos, proeza é conseguir não dizer imediatamente “não”. E tentar, com um módico de vontade que seja, para ao menos saberem do que são capazes.
Epilogar com a letal sentença da extemporaneidade é uma desistência própria de quem se limita a vegetar. Não dando conta de que se é apenas um autómato que não honra a sua própria existência.

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