Era tudo às avessas. O olhar transviado. O verbo malfadado. O sorriso a destempo. O agrado adiado. A divergência estrutural. A recusa da convocatória para serem construtivos. A autenticação da irresponsabilidade. O fermento no ninho contrafeito. A intransigência tumular. A falta de respeito por si próprios, a começar – para depois poderem ser críticos com os demais.
Era tudo de propósito. A propósito. Não queriam o proverbial encanto aos olhos dos outros: a sua militância era a hostilidade que os outros por eles acautelassem. Sempre em rota de colisão, avançavam por errância contra os embustes denunciados. Não era fácil a sua demanda. A vida levava-se pela intermediação das sucessivas contrariedades que os outros esgrimem, talvez por vingança contra a sua afronta constante.
Os que não eram como eles não conseguiriam ser sob pretexto de considerarem que ser desse modo é uma beligerância ateada, contínua – e ostensiva. Mas eles não se aferiam pela craveira dos que deles diferem. A sua linhagem era uma ausência. Órfãos de referências, afastavam-se da convencionalidade: temiam que a cedência ao convencional seria pô-los reféns de vontades que não eram as suas. Não transigiam com vontades exteriores. Não capitulavam. Preferiam ser órfãos, quase ilhas misantropas cercadas por bons costumes, e outro ser o mapa por que se regiam.
O seu lugar social era a solidão. Eles é que faziam de propósito para serem conduzidos à ostracização. Era o seu lugar inato. Se interrompiam a safra e procuravam habitar um lugar habitual entre os demais, depressa se sentiam acossados por um habitat que não era o seu. Sentiam-se corpos estranhos num lugar perdido na geografia mental que sabiam ser a sua. Por isso povoavam a celeuma, provocavam os santuários da habitualidade e os seus suseranos, sabendo do elevado preço que tinham de pagar: o isolamento num lugar ermo, abjurado pelos que habitam na maioria, acantonados na condição de párias.
A corda estirada era o pretexto para as trincheiras cavadas. Viviam de costas voltadas para as convenções. Provocavam-nas, agitando rostos afeados pelas palavras cáusticas. O tempo levava-os para a extravagante solidão social. Só podiam contar uns com os outros, como se houvesse uma solidariedade de casta. Mas nem isso: essa era uma condição que não conheciam e nem a comunhão de conduta os colocava próximos uns dos outros.
Atomizados no reverso da convencionalidade, levavam longe os compêndios do isolamento. Nunca poderia haver um sindicato dos ranhosos.
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