Não sobram vestígios da vetusta contabilidade que se abraça aos majestosos troncos de árvores centenárias. Os destroços estão espalhados na gramática que se consome nas suas aflições. Há a decadência que se aquartela na cumeada de onde a paisagem se oferece em socalcos. A decadência, que é quando o que se perde fica tangível, está embebida na carne magoada. Tem as suas cicatrizes, imorredoiras.
E, todavia, o pior ensaio é olhar pelo espelho que só tem avesso. As contabilidades que arrematam as perdas são paradoxalmente pueris, a frequência da sua utilização aumenta com a idade do usuário. Só a agnosia do presente justifica que o mergulho no passado não pareça supérfluo. Costuma lobrigar arrependimentos que parecem servir para legitimar, aos olhos próprios, o acontecido que, pudesse o tempo ser restaurado, não teria lugar em tempo algum. A pior ilegitimidade encontra-se nestes desvios do tempo sem caução. Nem os arrependimentos são um restabelecimento razoável, nem se compreende porque a autojustificação do pretérito é demandada.
O que se perde não é a cicatriz do erro que é legado do passado. O que se perde é a diligência do tempo que chega às mãos. Dir-se-á, em abono do resgate do tempo pretérito, que o olhar sobre o tempo vindouro só pode ser descomprometido se o passado estiver resolvido. As suas perdas não podem ser encorajadas para a posteridade, pois esse tempo pode chegar amputado pelas consequências exorbitantes que são herdadas.
O que é perdulário é todo esse exercício. O distanciamento do tempo pode embaciar a lucidez. A revisitação de acontecimentos já devidamente empoeirados pode acabar numa tresleitura. Todo o tempo desse modo consumido é esbanjado. Esmera-se uma função porém gratuita, que apenas dará a impressão de que o passado mal resolvido está arrumado com a intermediação do arrependimento. Sem lucidez para reconhecer que o exercício labora num equívoco do pensamento, refém do asseio do passado. Como se tivéssemos o dever da pureza.
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