31.8.22

Se tivesse de responder ao Questionário de Proust sem ser como exercício de autocontemplação

Baleia Baleia Baleia, “Babes do Zodíaco”, in https://www.youtube.com/watch?v=3NB6CTOhsic

1. Qual a sua ideia de felicidade perfeita?

- A perfeição não existe. A felicidade é uma quimera vendida pelos gurus de autoajuda (esses máximos burlões).

2. Qual é o seu maior medo?

- Citando Alexandre O’Neil, “o medo vai ter tudo/tudo (Penso no que o medo vai ter/e tenho medo/que é justamente/o que o medo quer).”

3. Na sua personalidade, que característica mais o irrita?

- Impaciência. Ser muito exigente comigo.

4. E qual o traço de personalidade que mais o irrita nos outros?

- Narcisismo. E falsa modéstia (que são falsos antónimos).

5. Que pessoa viva mais admira?

- Manuel João Vieira. Iggy Pop. Adília Lopes. 

6. Qual a sua maior extravagância?

- É inconfessável.

7. Qual o seu estado de espírito neste momento?

- Desinspirado.

8. Qual a virtude que pensa estar sobrevalorizada?

- Resiliência. (Tenho uma incompatibilidade genética com o contexto semântico em que a palavra apareceu no léxico e no idioma.)

9. Em que ocasiões mente?

- Tenho a impressão que mentir não compensa, não tanto por ser antiético mentir, mas porque sou assaltado pela sensação de que ser mau mentiroso é facilmente detetável pelo destinatário da mentira. (Ou talvez a resposta seja uma meta-análise sobre a mitomania.)

10. O que menos gosta na sua aparência física?

- Vivo bem dentro do meu corpo. Quase como se fosse um Adónis. (Confrontar com resposta à pergunta número 4).

11. Entre as pessoas vivas, qual a que mais despreza?

- Sendo propenso à santidade e beatitude, o desprezo pelos outros não tem cabimento.

12. Qual a qualidade que mais admira numa pessoa?

- Sê-lo (pessoa). Resposta alternativa: simplicidade (exatamente o que não consigo atingir).

13. Diga uma palavra – ou frase – que diga com muita frequência.

- Não sou repetitivo e tenho uma imensa riqueza de vocabulário, dando-se o caso de detestar a rotina, a monotonia e a mesmice.

14. O quê ou quem é o maior amor da sua vida?

- A Ana.

15. Onde e quando se sente mais feliz?

- Com a Ana, a viajar, a ver teatro e cinema, concertos, e outras coisas inconfessáveis.

16. Que talento não tem e gostaria de ter?

- Para completar a tríade dedicada à Ana: dançar. (No que pessoalmente me diz respeito: tocar piano e falar russo e alemão – para ter o topete de rivalizar com os grandes clássicos da literatura e os grandes filósofos contemporâneos.)

17. Se pudesse mudar alguma coisa em si, o que seria?

- Nada. (O que – estou consciente – entra em rota de colisão com a resposta à pergunta número 1.)

18. O que considera ter sido a sua maior realização?

- Publicar uns livros; tentar ensinar umas coisas mais ou menos interessantes na universidade; os concertos de Idles, Ty Segall, LCD Soundsystem, Sigur Rós, Antony and the Johnsons, Pond; comer tarântula nas Seychelles; a paternidade; e amar. (E outras coisas inconfessáveis.)

19. Se houvesse vida depois da morte, quem ou o quê gostaria de ser?

- Uma não pergunta não é merecedora de resposta, por manifesta impossibilidade do postulado na pergunta.

20. Onde prefere morar?

- Em casa.

21. Qual o seu maior tesouro?

- Um tesouro pressupõe um segredo (estarei errado na conceptualização de tesouro?). Por aí indo, não tenho tesouros dignos de nota.

22. O que considera ser o cúmulo da miséria?

- A indigência não auto-detetada. O David Fonseca. O PS. O tipo das selfies.

23. Qual é a sua ocupação favorita?

- Escrever. Viajar. Música. Poesia. Teatro. Filosofia.

24. Qual é a sua característica mais marcante?

- Autoexigência. Permanente insatisfação com o mundo e os seus preparos. 

25. O que mais valoriza nos amigos?

- Sê-lo – e a paciência para me aturarem.

26. Quem são os seus escritores favoritos?

- É mesmo para ostentar a erudição? (Fico-me pela simples ameaça, em jeito de auto-genuflexão ilustrativa de falsa modéstia.)

27. Quem é o seu herói de ficção?

- Não há heróis.

28. Com que figura histórica mais se identifica?

- Aristóteles (remissão para a pergunta número 26).

29. Quem são os seus heróis na vida real?

- Não há heróis.

30. Quais os nomes próprios que mais gosta?

- Desdémona, Gertrudes, Hermengarda, Diógenes, Sófocles, Atanagildo, Esperança.

31. Qual o seu maior arrependimento?

- Não ter arrependimentos para inventariar. (Mas atenção à resposta à pergunta número 9.)

32. Como gostaria de morrer?

- Tenho a firme convicção que isso não vai acontecer. Assim como assim, se a minha convicção for desmentida, não estarei presente para o testemunhar.

33. Qual o seu lema de vida?

- “Oh captain, my captain...” (só para aborrecer os que respondem “carpe diem”).

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