6.7.23

Enclave

Radiohead, “Burn the Witch”, in https://www.youtube.com/watch?v=yI2oS2hoL0k

Há ilhas por fora, o cerco a admoestar o medo limítrofe. Ilhas que são domínios que soam a império, e os enclaves à mercê de boas vontades que não transigem com a sua vontade. As boas vontades da ilha limítrofe, que o cerca.

Há ilhas que se refugiam na ameaça da beligerância, como se o estado permanente de terror fosse a vassalagem de que precisam para o ato generoso a favor do enclave. Ilhas sem fortaleza a não ser a longanimidade de quem exerce a tutela, como se a tutela fosse um desprendimento que garante o direito de existência. Ilhas não fortuitas, e os enclaves que se metamorfoseiam ilhas viradas do avesso. Num débito perene de dependência.

As orquestras adestram-se no chão consecutivo, olhando de fora para o enclave. A música soletrada é o alfabeto que confere a existência do enclave. Ela vem de fora, é a chancela que autoriza o enclave. Os músicos sabem o que o enclave precisa. Sabem que o enclave não tem músicos residentes. Não é um sucedâneo de suserania. É o critério que valida a existência do enclave, sem que sobre ele pese o medo do arrependimento e a ilha limítrofe devore o enclave. 

O enclave precisa de oxigénio. O cerco da ilha limítrofe esbraceja os vultos que podem cercear o oxigénio vital. É responsabilidade da ilha limítrofe dissolver o medo que se possa apoderar do enclave. Devia escrever, em letras vívidas, que o enclave não corre o risco de ser assimilado contra a sua vontade, tornando-se parte integrante da ilha limítrofe que perderia a condição de ilha limítrofe. Os impérios são atavismos. Não rimam com o tempo hodierno. São atropelos à vontade dos territórios anexados.

Por mais enraizadas as garantias, o enclave não desaloja o estigma do medo. É um território cercado, sujeito à superioridade da ilha limítrofe, vive em constante sobressalto. Não se fia nas garantias de sobrevivência entoadas pela ilha limítrofe. Esse entoar é causa do medo permanente: de tanto proclamar que não serão trespassadas as fronteiras, o enclave atemoriza-se, pergunta, continuamente, porque a ilha limítrofe tem de garantir continuamente o que só precisa de garantir se tiver dúvidas que possa respeitar.

Alguém disse que um enclave é uma anomalia. E outros tiraram consequências: uma anomalia exige retificação. O medo do enclave nunca mais cessou de pesar sobre os seus piores pesadelos.

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