Presos à anamnese do futuro, juravam a pés juntos que sabiam uns centímetros do futuro. Por mais que os desaconselhassem do futuro – por mais que sublinhassem, na ardósia que traziam nas mãos, que o futuro é a coisa mais desimportante de que podemos ser curadores. Dizia-se: o futuro é proibido, nunca chegar a existir; o seu prazo de validade esgota-se no agora que esvazia o futuro no presente.
Só os iludidos é que sussurravam as palavras que julgavam ecoar do futuro. No fundo, eram fingidores. Mergulhavam na sua amputação: meter um braço ou uma perna no futuro, era como de lá sair sem eles. Por mais que a advertência fosse pedagógica (o futuro, é o fruto proibido – e a vírgula não estava por acaso na oração), resistiam, debatiam-se com as forças de quem se esqueceu do presente. Era o fermento da esperança, o futuro de que não sabiam nada.
E, todavia, havia uma confraria do futuro. Gastavam todo o seu tempo à procura de oráculos convincentes, oráculos à prova de contestação. Arrumavam a contestação do presente com um bumerangue atirado à memória futura. Depois ficavam parados à espera da devolução, que é a física quântica do bumerangue. Esperavam pelas boas novas do futuro. De tão desanimados com o presente, eram viciados no futuro. No futuro proibido. Do futuro só se podiam esperar novidades que fossem boas. Mesmo que não fossem novidades e assim exaurissem a sua credencial de bondade. Eram os fautores de um totalitarismo intemporal.
Protestavam com veemência contra os que protestavam contra eles. Acusavam-nos de urdirem conspirações sucessivas contra o futuro. Acusavam esses déspotas de hipotecaram o futuro à conta da sua irascibilidade, à conta da sua incorrigível apreensão contra o futuro. Os procuradores do futuro tinham uma intendência: desmentir os apocalipses com marca registada do futuro, tirando do horizonte os vultos que o açambarcavam com o tempo presente.
E por mais que os apóstatas tirassem crédito ao futuro – como se fossem especuladores que apostam contra a benevolência do futuro, mendigando-o como um fardo –, os que colhiam as flores frescas do pressentimento do futuro não se convenciam que o futuro era proibido.
Essa era uma profecia que só os mortos podiam outorgar.
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